06 - Quem tem os intervalos mais curtos?

Equipe Editorial Bibliomed

No mundo inteiro, as mulheres variam amplamente em suas práticas de espaçamento dos filhos. Há muitos fatores que influenciam o espaçamento dos filhos de uma mulher, inclusive o estado de saúde do filho anterior e as características da própria mulher. Além disso, as práticas tradicionais – particularmente a amamentação e a abstinência após o parto, bem como os costumes – afetam o espaçamento dos nascimentos.

Sobrevivência e saúde do filho anterior

A saúde do último filho de uma mulher afeta freqüentemente o momento de nascimento do próximo. Se uma criança morre, particularmente no seu primeiro ano de vida, os casais tendem a ter o próximo filho mais cedo do que quando a primeira criança sobrevive. De forma semelhante, se a criança recém-nascida não tem muita saúde, é provável que os casais decidam ter o próximo filho sem esperar o tempo que esperariam se a criança fosse saudável.

Sobrevivência infantil. Estudos feitos no mundo inteiro, inclusive no Butão, Egito, Quênia, Vietnã e Zimbábue, mostram que os pais estarão inclinados a terem o próximo filho mais cedo se o recém-nascido morrer do que se sobreviver (25, 64, 68, 139, 185, 211, 212). Em todos os 55 países pesquisados pelas DHS entre 1990 e 2001, as mulheres demonstram maior probabilidade de terem seu próximo filho dentro de 3 anos se o filho anterior morrer (ver a Tabela 7).

Quando morre um filho, os intervalos que as mães dão até o próximo nascimento são, em média, 60% mais curtos do que quando esse filho sobrevive, de acordo com uma análise de dados de 46 DHS (62). Esse estudo também constatou que quanto mais tempo o filho anterior sobrevive, menor o efeito sobre o intervalo subseqüente até o próximo nascimento. Se a morte da criança ocorrer depois dos 2 anos de idade, ela parece não ter mais nenhuma influência sobre o intervalo subseqüente que a mãe dá até o próximo nascimento (62).

Nas áreas rurais do Senegal, as mães têm seu próximo parto dentro de um intervalo mediano de 15 meses, se o filho anterior morrer no primeiro mês de vida. Se morrer antes de completar 1 ano, as mães dão um intervalo mediano de 22 meses antes de ter seu próximo filho. Se o filho anterior morrer entre 1 e 2 anos de idade, as mães esperam um valor mediano de 29 meses; e quando a criança sobrevive por 2 anos, as mães esperam um valor mediano de 33 meses até ter o próximo filho (153).

Por que a morte de um filho provoca intervalos mais curtos até o próximo parto? Alguns casais acabam gerando muito rápido e inadvertidamente o próximo filho porque a morte prematura do filho anterior interrompe a amamentação e as mulheres voltam a menstruar e a ovular mais cedo (62). Em Gana, a duração mediana da amenorréia pós-parto reduziu-se de 12 para 4 meses entre as mulheres que perderam um filho prematuramente (123). Os dados das 46 DHS mostram que, em média, a sobrevivência infantil aumenta a duração da amenorréia pós-parto em 178% (62).

Outros casais fazem um esforço consciente para substituir o filho perdido prematuramente. Quando morre uma criança em idade muito tenra, a duração da abstinência sexual pós-parto pode reduzir-se em até 47%, de acordo com dados das 46 DHS (62). Mas alguns estudos constataram que a retomada da atividade sexual é menos importante do que a interrupção antecipada da amamentação para explicar porque o próximo filho nasce mais cedo quando um filho anterior morre ainda muito pequeno (129, 181).

As mulheres cujas gravidezes terminam em aborto natural ou induzido têm geralmente maior probabilidade de ter o próximo filho rapidamente. Mas poucos estudos tiveram a oportunidade de examinar esta relação porque os abortos espontâneos, os natimortos e os abortos induzidos são raramente registrados. Um estudo do Centro Latino-americano de Perinatologia e Desenvolvimento Humano constatou que metade das adolescentes de até 19 anos, cujas gravidezes terminaram em aborto natural ou induzido, engravidaram de novo dentro de 2 anos, comparadas com cerca de um terço das adolescentes que tiveram um parto bem sucedido anteriormente. Entre as mulheres de 20 a 24 anos, 28% daquelas cujas gravidezes terminaram em aborto natural ou induzido engravidaram de novo dentro de 2 anos, comparadas com 21% daquelas cujo parto anterior foi bem sucedido (37).

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No entanto, um estudo africano constatou que as mulheres cujas gravidezes terminam em abortos espontâneos ou natimortos têm menos probabilidade de ter um próximo filho logo em seguida. Em Gâmbia, as mulheres que tiveram abortos espontâneos ou natimortos tinham maior probabilidade do que as outras de adiar o próximo parto, usando para isto a contracepção. Cerca de 14% das mulheres que tiveram abortos espontâneos usaram a contracepção em seguida, uma porcentagem muito maior do que as que usaram anticoncepcionais durante a amamentação ou após o desmame. Quando lhes pediram para explicar por que usaram a contracepção depois de um aborto espontâneo ou de ter um filho natimorto, as mulheres informaram que queriam descansar o corpo, se recuperar e aumentar suas possibilidades de dar à luz uma criança mais saudável no futuro (21).

Saúde infantil. Se um recém-nascido sobreviver mas não tiver boa saúde, as mulheres tendem a ter seu próximo filho mais cedo. Uma explicação é a de que recém-nascidos menos saudáveis têm menor probabilidade de serem amamentados (112). Se os bebês não conseguem se alimentar com o leite materno com a devida freqüência e intensidade, as mães voltam a ovular mais rapidamente e, sem contracepção ou abstinência sexual, podem engravidar de novo com maior brevidade (115). Além disso, se uma mulher estiver preocupada com a possibilidade de que seu filho morra ainda muito pequeno, ela poderá tentar ter uma criança mais saudável logo em seguida. Pela mesma razão, as mães cujos recém-nascidos tenham baixo peso poderão também ter o próximo filho logo em seguida (18, 112).

Características das mulheres

São variadas as características demográficas e socioeconômicas que influenciam as práticas de espaçamento das mulheres, entre elas a idade da mulher à época do nascimento de cada filho, o número de filhos que ela já tem, sua instrução escolar, condição social, participação na força de trabalho e local de residência.

Idade da mãe e número de filhos. As mulheres mais jovens têm maior probabilidade do que as mais velhas de ter seu próximo filho dentro de 3 anos (ver a Tabela 7). Em todos os 50 países para os quais existem dados DHS, 60% ou mais das mulheres de 15 a 19 anos exibem intervalos inferiores a 3 anos entre um filho e outro. Em somente 2 dos 55 países, 60% das mulheres com 40 ou mais anos de idade têm esses intervalos inferiores a 3 anos. Em alguns países, tais como Botsuana, Brasil, Etiópia e Togo, há pouca ou nenhuma diferença após os 30 anos de idade.

Na maioria dos países, as mulheres que têm menos filhos têm também intervalos entre seus partos mais curtos do que as mulheres que têm mais filhos, mas em outros países ocorre o inverso. Em 21 dos 28 países estudados com dados DHS, as mulheres que têm 1 ou 2 filhos apresentam intervalos mais curtos entre os partos do que as mulheres com 4 ou 5 filhos. Em 19 dos 28 países, seus intervalos entre os nascimentos eram inferiores em 2 meses ou mais, e em 4 países, os intervalos eram inferiores em 4 meses ou mais. Mas em outros 5 países – Brasil, Colômbia, Indonésia, Namíbia e Paraguai – as mulheres com 4 ou 5 filhos demonstravam intervalos mais curtos entre os partos (105).

Educação. Em 38 dos 51 países com dados DHS, as mulheres sem nenhuma instrução escolar tinham maior probabilidade do que as mulheres que haviam recebido instrução escolar de ter um espaçamento inferior a 3 anos entre os partos (ver a Tabela 7). Mas em 7 países pesquisados, as mulheres que tinham nível de instrução secundária ou mais elevada tinham mais chances de ter intervalos inferiores a 3 anos. Uma explicação seria que, nesses países, as mulheres com nível educacional mais elevado se casam mais velhas e, depois, têm os filhos um atrás do outro (35, 118, 147). Em outros 7 países, há pouca ou nenhuma diferença entre as mulheres sem nenhuma instrução e as mulheres com instrução secundária ou superior quanto aos intervalos entre seus partos.

Os pesquisadores não conseguiram explicar ainda por que os níveis de instrução das mulheres afetam os intervalos entre seus partos de forma diferente de um lugar para outro. As diferenças quanto às preferências de procriação poderão explicar em parte as diferenças no espaçamento dos partos (ver o quadro na pág. 7). Em alguns países, as mulheres com mais instrução escolar têm uma maior probabilidade de usar a contracepção para prolongar os intervalos entre seus partos (166, 184). Além disso, é provável que as mulheres com mais instrução trabalhem fora de casa ou vivam em áreas urbanas, ambos fatores que podem levar a um maior espaçamento dos filhos.

Condição social e emprego. As mulheres de condição social inferior, seja em seus lares ou na sociedade, e as mulheres que não têm um emprego tendem a ter intervalos mais curtos entre os partos do que as mulheres de condição social mais elevada ou que estão empregadas. Por exemplo, na Turquia, as mulheres que têm menores poderes quanto à reprodução e quanto à tomada de decisões econômicas e que, em geral, não trabalham fora de casa, apresentam intervalos entre os partos que são 5,4 meses mais curtos do que os apresentados pelas mulheres com maior poder de decisão e que geralmente têm um emprego (76). Na Índia, entre as mulheres de condição social e econômica inferior, a mediana dos intervalos entre os partos é de 14 meses, comparada com a mediana de 21 observada entre as mulheres de condição mais elevada (118). Em alguns países, a participação na força de trabalho tem pouco ou nenhum efeito sobre quando as mulheres têm seu primeiro filho, mas influencia quando elas têm filhos subseqüentes (46, 127). Também, as mulheres que trabalham fora do lar, particularmente as que trabalham em centros urbanos, podem ter melhor nível de instrução e ter maior probabilidade de usar a contracepção para espaçar seus partos (166).

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Lugar de residência. Em 51 dos 55 países pesquisados pelas DHS, as mulheres que vivem em áreas rurais têm maior probabilidade do que as mulheres de áreas urbanas de ter um intervalo inferior a 3 anos entre seus partos. As maiores diferenças são encontradas na América Latina e Caribe, Europa Oriental e Ásia Central. Em somente 3 países – Chade, Moçambique e Paquistão – as mulheres urbanas têm maior probabilidade do que as da área rural de ter intervalos inferiores a 3 anos. Em dois países, há pouca ou nenhuma diferença (ver a Tabela 7). Estas constatações não causam surpresa, já que as mulheres das áreas urbanas dispõem de melhor acesso à educação e melhores oportunidades de emprego.

Normas culturais

Entre as normas culturais e os costumes que influenciam as práticas das mulheres quanto ao espaçamento dos filhos estão a pressão social para que as mulheres provem sua fertilidade e as práticas de amamentação e abstinência sexual pós-parto. As preferências por filhos do sexo masculino também podem afetar os intervalos entre os filhos.

Pressão para provar a fertilidade. Os casais que enfrentam a pressão de suas famílias ou da sociedade para procriarem desejam ter seu primeiro filho logo após o casamento e continuar a ter filhos em rápida seqüência. Em algumas sociedades, ter muitos filhos e rapidamente é uma demonstração de que o marido é viril e a esposa é fértil. Por exemplo, na sociedade indiana tradicional, a procriação dá prestígio a uma recém-casada e, portanto, os casais querem ter os filhos logo após o casamento (118, 148). A pressão social para gerar filhos rapidamente também é comum na África sub-Saara e no Oriente Médio e Norte da África (49).

Práticas de amamentação. O fato das mulheres amamentarem ou não, bem como a freqüência e tempo da amamentação influenciam suas práticas de espaçamento dos filhos (54, 72, 119, 208, 209). Em praticamente todos os países em desenvolvimento, quase todas as mulheres amamentam seus filhos recém-nascidos (65, 93). Mas as práticas de amamentação diferem de uma cultura a outra, tanto em duração como freqüência (93, 206). Nas regiões ainda em desenvolvimento, a duração da amamentação varia de uma média de 14 meses na América Latina e Caribe a 21 meses na África sub-Saara (65).

As práticas de amamentação ajudam a determinar por quanto tempo as mulheres permanecerão em amenorréia – sem menstruação e, portanto, com menor risco de engravidar – depois de dar à luz (207). As mulheres que amamentam seus bebês exclusiva ou quase exclusivamente permanecem em amenorréia por mais tempo (92). Nos 55 países com dados DHS, as mulheres da África sub-Saara apresentam a maior duração mediana da amenorréia pós-parto, variando de cerca de 7 meses em Comoros a 17 meses em Ruanda. As mulheres do Oriente Médio e do Norte da África são as que menos persistem na amamentação, variando de 3 meses na Turquia a 6 meses no Iêmen. O fato de ter mais filhos e de ser desnutrida também alonga o período de amenorréia da mulher (207).

Abstinência pós-parto. Os casais que não praticam a abstinência sexual pós-parto – evitar relações sexuais durante vários meses após um parto – tendem a ter seu próximo filho muito rápido. Mas a abstinência sexual pós-parto é comum em vários países. Quando a duração dessa abstinência é superior à amenorréia pós-parto, esta prática pode ajudar as mulheres a adiar sua próxima gravidez. As crenças tradicionais influenciam geralmente a atividade sexual depois de um parto (149). Por exemplo, em Lesoto, as mães são afastadas dos seus maridos por quanto tempo elas estiverem amamentando, porque acredita-se que ter relações sexuais com uma mulher lactante pode estragar seu leite (98).

Apesar de haver vários tabus contra a atividade sexual pós-parto, sobretudo na África, a duração da abstinência pós-parto varia consideravelmente tanto dentro dos países como entre os países (190). Entre os 55 países pesquisados pelas DHS desde 1990, a duração mediana da abstinência pós-parto na África sub-Saara varia de 2 meses, em Uganda, a 22 meses na Guiné. Em outros países, com poucas exceções, o período varia de 1 a 3 meses. Nos países onde o período de abstinência pós-parto é praticamente o mesmo ou mais curto do que o período da amenorréia – como no Chade, Guatemala e Nepal – a abstinência por si só tem pouco efeito sobre os intervalos entre os partos (62).

Em muitos países, os efeitos combinados da abstinência sexual pós-parto e da amenorréia – a insuscetibilidade pós-parto – são responsáveis pelo espaçamento dos nascimentos em até 2 anos (65, 179). Em 26 dos 55 países pesquisados, a duração mediana da insuscetibilidade pós-parto é de 1 ano ou mais e quase 2 anos em Burkina Faso e Guiné. A duração mediana é inferior a 6 meses em somente 9 países pesquisados.

Preferência por meninos. Os casais que preferem ter filhos do sexo masculino tendem a ter o próximo filho logo após o nascimento de uma filha. Por exemplo, na China, entre as mulheres que deram à luz uma menina, a maioria teve o próximo filho dentro de 37 meses. Em contraste, entre as mulheres que tiveram um menino, a maioria teve o próximo filho em 46 meses (58). Nos 55 países com dados, as mulheres têm maior probabilidade de ter o próximo filho dentro de 3 anos após o nascimento de uma filha do que após o nascimento de um filho, em todas as regiões exceto a América Latina (ver a Tabela 7).

A preferência por meninos é particularmente acentuada no Sul e Leste da Ásia, onde as pessoas dão mais valor aos filhos do que as filhas. Por exemplo, na Coréia, são os filhos varões que continuam a linhagem familiar, fazem as preces aos antepassados e podem ajudar a cuidar dos pais na velhice destes (96). De forma semelhante, na Índia, são os filhos varões que têm mais valor econômico, social e religioso aos olhos de seus pais (11), que podem ver as filhas como um fardo econômico (88).

Population Reports é publicado pelo Population Information Program, Center for Communication Programs, The Johns Hopkins School of Public Health, 111 Market Place, Suite 310, Baltimore, Maryland 21202-4012, USA.

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