Introdução um ventrículo esquerdo dominante (quando o ventrículo
direito é rudimentar e incompleto);
Em corações onde um ventrículo é dominante, o
ventrículo rudimentar pode variar sua posição, mas quase sempre ventrículos direitos
rudimentares são encontrados ântero-superiormente, enquanto que ventrículos esquerdos
rudimentares ocupam uma posição póstero-inferior na massa ventricular (veja Capítulo 7).
A análise segmentar seqüencial1-3 dos
corações permite a descrição de malformações cardíacas congênitas complexas de uma
maneira direta e simples. Todos os corações, normais ou anormais, são constituídos por
três segmentos - os átrios, a massa ventricular e os troncos arteriais (figura 2.1). As anormalidades congênitas podem
estar presentes em um ou mais de tais segmentos. Podem também ocorrer anormalidades na
entrada das grandes veias ou na saída das artérias do coração. A estrutura básica
deve ser descrita em primeiro lugar. Depois disso, todas as malformações associadas
devem ser identificadas. Em muitos corações anormais as malformações associadas são a
única anormalidade, mas é importante estabelecer se a estrutura básica é normal em
cada caso.
Achados Usuais
Cada um dos três segmentos do coração normal tem um
componente direito e um esquerdo. Uma das principais características dos corações
congenitamente malformados é que as estruturas nem sempre estão situadas nos locais
esperados. Os termos "morfologicamente direito" e "morfologicamente
esquerdo" devem, portanto, ser usados para descrever estruturas. Dessa forma, as
descrições terão sentido mesmo quando as estruturas estiverem localizadas anormalmente.
Para saber se as câmaras cardíacas são normais, deve-se observar a estrutura de seus
componentes mais constantes usando o "método morfológico".4 Para os
átrios, o componente mais constante é o apêndice atrial. As diferenças entre os
apêndices atriais morfologicamente direito e esquerdo5 sempre nos permitem
determinar a sua natureza (figuras 2.2a, 2.2b). A forma do apêndice morfologicamente
direito é um triângulo de base larga, enquanto que o apêndice esquerdo é tubular e
encurvado (ver figuras 2.2a, 2.2b). Ainda mais diferente é a junção
entre o apêndice e o componente atrial de parede lisa. No apêndice morfologicamente
direito, tal junção é ampla e marcada por uma extensa crista com músculos pectíneos,
enquanto que no esquerdo ela é estreita, sem crista e com poucos músculos pectíneos (figura 2.3). Tais diferenças são vistas
claramente tanto através da ressonância nuclear magnética como da ecocardiografia
transesofágica (ver Capítulo 1). O segundo
segmento cardíaco, a massa ventricular, quase sempre contém dois ventrículos, embora
raramente possa existir uma ventrículo solitário de morfologia indeterminada (figura 2.4). Quando dois ventrículos estão
presentes, são sempre de morfologia direita e esquerda. A morfologia ventricular é
melhor determinada através do componente trabecular apical (figura 2.5). Trabeculações grosseiras são
características do ventrículo morfologicamente direito, e trabeculações finas do
ventrículo morfologicamente esquerdo.
Todos os ventrículos podem possuir componentes de entrada
e/ou de saída. Ventrículos normais possuem um de cada. O melhor guia para se distinguir
o ventrículo morfologicamente direito que só tem via de entrada é a presença de cordas
tendíneas, fixando o aparelho valvar tricuspídeo ao septo. Isto não é observado no
ventrículo morfologicamente esquerdo (figura
2.6).
Os troncos arteriais, constituindo o terceiro segmento do
coração, são sempre identificados por seu padrão de ramificação. Em corações
normais, a aorta dá origem a ramos sistêmicos e coronarianos, enquanto que o tronco
pulmonar divide-se em artérias pulmonares direita e esquerda. Isto também é verdadeiro
para corações anormais, mas duas outras formas de arranjo podem ser encontradas (figura 2.7). A primeira, o tronco arterial
comum, supre diretamente todas as artérias coronárias, sistêmicas e pulmonares. A
segunda forma ocorre em corações sem artérias pulmonares centrais intrapericárdicas.
Existe uma única grande artéria originando-se do coração, sendo impossível definir se
ela é uma aorta ou um tronco comum6 e, portanto, será melhor descrita como
tronco arterial solitário.
As características morfológicas de "direita" e
"esquerda" são também observadas no resto dos órgãos torácicos e abdominais
e, quase sempre, existe uma concordância entre os diferentes órgãos de um mesmo lado
(ver abaixo). As características que distinguem os órgãos morfologicamente direitos e
esquerdos são mostrados na figura 2.8.
Arranjo Atrial
O primeiro passo na análise seqüencial é determinar o
arranjo atrial. Existem quatro possíveis formas de arranjo (figura 2.9).
Arranjo atrial usual (solitus), onde o átrio
morfologicamente direito está situado à direita e o o morfologicamente esquerdo à
esquerda, é habitualmente encontrado com lateralização normal dos outros órgãos
tóracoabdominais, como é visto na figura 2.8.
O arranjo "em espelho" (inverso), como esperado, correlaciona-se com inversão
da lateralidade dos outros órgãos (figura
2.10).
Os outros padrões de arranjo atrial, nos quais ambos os
apêndices são de mesma morfologia, são chamados isomerismos atriais, ou, mais
precisamente, isomerismo dos apêndices atriais. Eles estão quase sempre associados a um
padrão "misturado" dos órgãos abdominais (a assim chamada heterotaxia). O
isomerismo dos brônquios quase sempre se correlaciona corri o isomerismo atrial (figura 2.11), mas os órgãos abdominais
mostram variabilidade maior. Na maioria dos casos, a ausência do baço (asplenia)
acompanha o isomerismo atrial direito, enquanto que múltiplos baços (figura 2.12) são encontrados em pacientes com
isomerismo esquerdo.
Clinicamente, o isomerismo atrial pode ser determinado
diretamente a partir do reconhecimento da morfologia dos apêndices ou indiretamente a
partir da morfologia brônquica7 ou da localização da aorta e de veia cava
inferior no abdome8 (veja Capítulo 4).
Variação na Junção Atrioventricular
Para descrever a junção atrioventricular, deve-se
primeiramente determinar como o miocárdio atrial está conectado à massa ventricular. Em
seguida, deve-se determinar o padrão das valvas atrioventriculares. Existem dois grupos
de conexões atrioventriculares. Nas conexões ditas biventriculares, cada átrio está
conectado ao seu próprio ventrículo. Com o arranjo usual ou com a imagem "em
espelho "dos átrios, as conexões biventriculares podem ser concordantes (átrio
direito conectado ao ventrículo direito e átrio esquerdo ao ventrículo esquerdo) ou
discordante (átrio direito ao ventrículo esquerdo e átrio esquerdo ao ventrículo
direito, figura 2.13). Quando os apêndices
atriais são isoméricos, as conexões biventriculares não podem ser subdivididas dessa
forma e são descritas como ambíguas (figura
2.14). Quando existe conexão atrioventricular ambígua a estrutura tridimensional, ou
topologia, da massa ventricular deverá ser descrita. Poderá ser um dos dois padrões:
topologia de mão direita ou de mão esquerda. Tal padrão pode ser determinado
imaginando-se a palma de uma mão colocada sobre a superfície septal do ventrículo
morfologicamente direito (figura 2.15).
O segundo grupo de conexões atrioventriculares é a
conexão univentricular. Ela é encontrada quando um ventrículo tem uma dupla via de
entrada, ou então quando a conexão à direita ou à esquerda está ausente (figura 2.16). Os átrios estão conectados a:
Pode haver duas valvas atrioventriculares ou então uma
valva única, comum (figura 2.17).
Quando há duas valvas atrioventriculares, uma delas
poderá ser estenótica, regurgitante, imperfurada, apresentar inserção de seu aparelho
valvar em ambos os lados do septo, ou ainda apresentar cavalgamento (o orifício valvar
cavalga o septo, figura 2.18). Quando
existe uma valva atrioventricular cavalgando, a morfologia do coração será
intermediária entre a conexão atrioventricular biventricular e a univentricular.
Categorias intermediárias não se definem. A distinção entre os dois tipos de conexão
é arbitrária. Se menos de 50% da valva cavalga o septo, então a conexão é descrita
como biventricular. A conexão será univentricular apenas se mais de 50% de ambas as
valvas se abrem dentro de um mesmo ventrículo (a regra dos 50%9). Valvas
comuns podem também ser estenóticas ou insuficientes. Elas podem ainda ser parcialmente
imperfuradas. Usualmente (mas nem sempre) elas cavalgam e têm seu aparelho tensor
inserido dos dois lados do septo. Valvas solitárias (aquelas encontradas com ausência de
uma conexão atrioventricular) podem também ser insuficientes, cavalgar ou apresentar
inserção contralateral de cordas. Cavalgamento de uma valva atrioventricular solitária
é um conceito importante (figura 2.19),
uma vez que produz uma conexão uniatrial mas biventricular.10
A relação espacial entre os ventrículos é independente
da conexão atrioventricular. Quando necessário, nós descrevemos a posição do
ventrículo direito relativamente ao esquerdo, em termos de anterior, posterior, superior,
inferior, à direita ou à esquerda.
Variação na Junção Ventriculoarterial
Aqui, novamente, a forma pela qual os troncos arteriais
estão conectados à massa ventricular deve ser analisada separadamente da morfologia das
valvas arteriais. A morfologia das estruturas infundibulares deve também ser descrita,
assim como as relações das valvas entre si, e as relações espaciais entre os troncos
arteriais. São as conexões ventriculoarteriais, todavia, que são mais importantes.
Quando há dois troncos arteriais presentes, eles podem estar conectados à massa
ventricular de forma concordante ou discordante (figura 2.20). Alternativamente, ambas as
artérias podem emergir de um mesmo ventrículo, que poderá ser o direito, esquerdo, ou
de morfologia indeterminada (figura 2.21).
Cavalgamentos de valvas arteriais são assinalados ao ventrículo suportando a maior parte
de sua circunferência (regra dos 50%), evitando a necessidade de categorias
intermediárias. Quando apenas um tronco arterial está conectado à massa arterial,
então existe via de saída única do coração (figura 2.22). Tal via de saída única dá-se
usualmente através de um tronco comum guarnecido por uma valva arterial comum. Pode ainda
se dar através de um tronco solitário, ou mesmo através de uma aorta ou tronco
pulmonar, quando é impossível localizar a origem do outro tronco, atrésico.
Malformações
Associadas
A maior parte deste atlas estará envolvida com a
descrição de características morfológicas e sua imagens clínicas correspondentes, das
diversas lesões encontradas dentro do coração. Tais lesões serão descritas começando
pelas grandes veias, depois os átrios e os ventrículos, e finalmente as grandes
artérias. Atenção particular será dada às lesões que afetam as junções
atrioventricular e ventriculoarterial.
Posição
do Coração
Referências
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