Capítulo 04 - Fisiopatologia da Parada Cardiorrespiratória Capítulo 04 - Fisiopatologia da Parada Cardiorrespiratória

A parada cardiorrespiratória pode ocorrer em indivíduos cardiopatas e não-cardiopatas. Define-se parada cardíaca primária como aquela decorrente de disfunção cardíaca na ausência de fator desencadeante extracardíaco, e parada cardíaca secundária como evento terminal evolutivo de muitas doenças.

Em qualquer destas situações, o débito cardíaco é inadequado para a manutenção da vida, com volume sistólico insuficiente para perfusão tecidual, determinando redução de oxigênio disponível, o que leva o metabolismo anaeróbio a determinar acidose láctica, que pode ter um efeito negativo sobre a contratilidade do miocárdio.

O cérebro, ao contrário de outros órgãos, não armazena glicose ou oxigênio, e seu metabolismo realiza-se 95% através do metabolismo da glicose, em forma aeróbica. Em situações não-patológicas, recebe de 15 a 20% do débito cardíaco, sendo extremamente dependente do fluxo sangüíneo devido a seu alto consumo energético. Quando ocorre privação de oxigênio, devido a um fluxo sangüíneo cerebral baixo ou ausente, ocorre interrupção parcial ou total do seu metabolismo normal, iniciando-se um processo anaeróbio. Após 4 a 6 minutos de isquemia global, praticamente todo o ATP (adenosina trifosfato) foi consumido, ocorrendo acúmulo de ácido lático e fosfatos resultantes da degradação de ATP e ADP (adenosina difosfato), aumentando a proporção lactato/piruvato e iniciando-se a produção de dois moles de ATP por mol de glicose, produzindo, então, durante algum tempo, a energia necessária para a sobrevivência neuronal. Porém, com este consumo extremamente elevado do ATP, ocorre insuficiência da bomba de sódio e potássio, com perda do potencial transmembranoso e conseqüente edema cerebral. Com o edema cerebral a quantidade de liquor diminui, e se a pressão intracraniana continuar aumentando, leva à redução do fluxo sangüíneo em veias e artérias devido à sua compressão, reduzindo ainda mais a perfusão cerebral.3,25

Na vigência de uma parada cardiorrespiratória prolongada, em que as funções circulatória e respiratória não foram restabelecidas, a hipóxia e a acidose prolongadas promovem alterações fisiopatológicas irreversíveis que culminam com a morte orgânica.41

Um dos objetivos do ressuscitador deve ser o da preservação cerebral durante e após as manobras de ressuscitação, que se dá através de uma manutenção adequada do fluxo sangüíneo cerebral (FSC) . A restauração da perfusão cerebral após a PCR resulta em aumento global do FSC, apesar de áreas de hipoperfusão ainda permanecerem. A pressão de perfusão cerebral (PPC) é obtida calculando-se a diferença entre a pressão arterial média (PAM) e a pressão intracraniana (PIC) . A pressão de perfusão cerebral deve ser mantida acima de 50 mmHg, e é um bom indicador do fluxo sangüíneo cerebral.24,22,50

PPC = PAM - PIC

PPC = pressão de perfusão cerebral
PAM = pressão arterial média
PIC = pressão intracraniana

No período de hipoperfusão ocorre um hipermetabolismo celular pós-isquêmico, que leva a um desequilíbrio entre a oferta de sangue e o consumo celular, que contribui na piora do dano cerebral.

Considerando-se que a reserva cerebral de glicose dura em média quatro minutos — após o que cessa a metabolização da glicose no cérebro — é importante que as manobras de ressuscitação sejam instauradas nesse período para a restauração das funções orgânicas.

Durante a parada cardiorrespiratória, órgãos como o fígado e os rins cessam suas funções, sendo que no fígado ocorre cessação de sua função de desoxidação e excreção, provocando acúmulo de metabólitos prejudiciais na circulação. Nos rins, ocorre anúria devido à suspensão da filtração, reabsorção, excreção e secreção, como conseqüência de distúrbios histológicos causados por isquemia, como necrose cortical bilateral e tubular aguda.13

Ocorre também, com a interrupção da circulação, uma elevação súbita da secreção de glicocorticóides e de ACTH, com possível efeito protetor, promovendo vasoconstricção e mobilização do glicogênio hepático, com a finalidade de compensar as alterações orgânicas da anóxia e isquemias existentes.

Em relação ao coração, um baixo débito cardíaco significa também diminuição do fluxo sangüíneo em artérias coronárias, piorando a isquemia do miocárdio, que poderia ter sido a causa primária da PCR, estabelecendo, então, um ciclo de retroalimentação: isquemia miocárdica baixo débito cardíaco.

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