Capítulo 01 - Revisão de Anatomia do Tecido de Condução
Capítulo 01 - Revisão de Anatomia do Tecido de Condução
Parte I - Anatomia do Nó Atrioventricular
Anton E. Becker
Introdução
O advento da ablação com cateter para as taquicardias causadas pelos circuitos de reentrada das conexões atrioventriculares (AV) acessórias e do nó atrioventricular despertou o interesse sobre a morfologia detalhada do nó atrioventricular. O sucesso deste procedimento está fora de discussão, mas a questão sobre o que é exatamente eliminado permanece em especulação. Este ponto é enfatizado pelo sucesso da ablação com cateter da chamada via lenta, em locais próximos ao seio coronário, em pacientes com taquicardia por reentrada do nó atrioventricular.1-3 Os registros eletrofisiológicos do local alvo revelam potenciais duplos, atualmente utilizados como um marcador para a ablação da via lenta e, conseqüentemente, como um guia para o alvo correto em um procedimento bem-sucedido. Todavia, a morfologia dos potenciais duplos não é homogênea e pode variar de um potencial de alta freqüência, seguido de um de baixa freqüência,1 a potenciais caracterizados por uma seqüência reversa de potenciais.3 Além disso, potenciais similares podem ser registrados em locais distantes da via lenta.1,4
O acima exposto justifica uma nova visão sobre a morfologia do nó atrioventricular e da área juncional do septo em humanos. O sucesso da ablação com cateter para a taquicardia é totalmente conhecida atualmente, mas o(s) substrato(s) envolvido(s) permanece(m) amplamente desconhecido(s).
Anatomia do Nó Atrioventricular
Esta revisão enfatiza a área juncional do septo atrioventricular em humanos, utilizando a nomenclatura proposta com base em estudos relatados inicialmente em 1975,5,6 sustentando muitos aspectos descritos por Tawara,7 Lev8 e Truex.9-11
O nó atrioventricular é composto de pequenas células com um arranjo entrelaçado complexo: o nó desta maneira definido descrito inicialmente por Tawara em 1906 como knoten é melhor conhecido como o nó atrioventricular compacto, uma vez que forma uma continuidade com o feixe penetrante (His), descrito por Tawara como a porção atrial do feixe atrioventricular (Knoten, d.h. Vorhofsteil des Atrioventrikularbundels p. 197),7 originando o termo eixo do feixe nodal.5-6 O nó atrioventricular compacto está localizado no ápice do triângulo de Koch, formado pelo tendão de Todaro (um feixe de colágeno que inicialmente percorre superficialmente o septo sinusal e se insere no interior do corpo fibroso central CFC), no septo membranoso (parte do CFC) e na linha de partida da cúspide septal da válvula tricúspide (Fig. 1-1).
A área que contém o nó AV compacto basicamente constitui a estrutura septal entre o átrio direito e o ventrículo esquerdo, conhecida como a parte muscular do septo atrioventricular (a contraparte da porção membranosa do septo atrioventricular (Fig. 1-2). Este septo atrioventricular muscular é composto de músculo ventricular e atrial sobrepostos e contém o nódulo atrioventricular compacto na porção atrial ascendente. O nó compacto apresenta uma forma semi-oval e repousa sobre um assoalho de tecido conectivo, que é uma extensão do CFC, separando o músculo atrial direito do músculo septal ventricular (Fig. 1-3). Esta arquitetura deixa o nó atrioventricular compacto posicionado quase no meio do septo atrioventricular muscular. Quando abordado pelo lado atrial direito, o nó compacto é coberto por uma zona de células de transição onduladas e pequenas (veja adiante).
Em direção anterior à área do septo membranoso, o nó compacto gradualmente se entranha no interior do tecido conectivo do corpo fibroso central e é, eventualmente, totalmente envolvido por tecido fibroso, sendo, conseqüentemente, isolado dos impulsos atriais. O local do "último contato atrial" foi definido como o local de transição entre o nó AV compacto e o feixe penetrante (His).5,6 Na maioria dos corações normais, tanto o nó compacto como o feixe penetrante mostram cordões de células especializadas se estendendo para o interior do corpo fibroso central. Quando traçados em secções seriadas ou eles se conectam ou aparecem como tratos com "saída cega." Esta arquitetura é conhecida como dispersão fetal e os grupos dispersos de células nodais também são referidos como arquipélagos e tratos de Mahaim. Estes prolongamentos nodais muito raramente ligam o eixo do feixe nodal ao septo ventricular subjacente, apesar de os grupos de células especializadas estarem freqüentemente posicionadas quase contiguamente às células miocárdicas ventriculares. Portanto, foi mais do que apenas um interesse histórico, que fez com que Mahaim12 descrevesse as conexões do feixe de His com o septo ventricular, embora não tenha mencionado o envolvimento do nó AV. Posteriormente, o nó compacto se divide em um prolongamento direito e outro esquerdo, freqüentemente, com a artéria nodal AV passando no meio. Ambos os prolongamentos posteriores podem variar consideravelmente em comprimento, mas eventualmente diminuem de tamanho e desaparecem, com o prolongamento esquerdo freqüentemente envolvido no interior do tecido fibroso do corpo fibroso central. O nó AV compacto é uma estrutura semi-oval, composta de pequenas células com um arranjo entremeado complexo, localizado no ápice do triângulo de Koch, quase no meio do septo atrioventricular muscular, com prolongamentos posteriores que se aproximam do local do óstio do seio coronário, e um prolongamento anterior que continua como o feixe penetrante (His).
As Células de Transição
As células de transição se interpõem entre as células miocárdicas (miócitos) da proximidade do nó e as células do nó AV compacto (Fig. 1-3). As chamadas células de acesso ao nó se ligam às células de transição pelo menos na sua maior parte que por sua vez se ligam ao nó AV compacto. As células de transição são assim denominadas pois são células transicionais quanto às suas características morfológicas entre células miocárdicas de contração e células nodais compactas. Como resultado, não existe uma uniformidade entre as células de transição, mas elas expressam uma heterogeneidade com desvios na morfologia, dependendo da sua posição em relação ao nó compacto.
A área que contém as células de transição não está confinada ao local do nó compacto. A área pode ser descrita em termos de anterior (relacionada ao eixo feixe-nodal) e posterior (relacionada ao espaço posterior ao nó compacto), tão profundas quanto superficiais. Os grupos de células de transição profundas são fortemente ligados às células miocárdicas derivadas do lado esquerdo do septo atrial, enquanto as superficiais são ligadas principalmente às células cardíacas de contração no lado direito (Fig. 1-3). Posterior ao nó compacto, podem ser encontradas células de transição tanto superficiais como profundas, no espaço abaixo e diretamente em frente ao óstio do seio coronário. As células são organizadas principalmente na direção póstero-anterior e se inserem nos prolongamentos posteriores do nó compacto. Na área anterior, as células de transição superficiais e profundas correm principalmente na direção crânio-caudal, com conexões transversas conforme penetram no nó compacto. Na zona em que a última fibra atrial se contacta ao nó compacto (pela definição, o local de transição entre o nó e o feixe),5,6 ainda existe presença das células de transição superficiais, apresentando uma orientação crânio-caudal. Ao longo de toda a área do triângulo de Koch, parte da camada superficial das células de transição cruza o eixo do feixe nodal e se fixa no tecido fibroso, na base da valva tricúspide. Este arranjo foi descrito por Paladino, que naquela época (1876) considerou estas células musculares como as tão procuradas conexões musculares entre os átrios e os ventrículos (veja a introdução histórica no trabalho monumental de Tawara (p. 4).7
O sucesso da ablação por cateter para taquicardias é, hoje em dia, absolutamente reconhecido, mas o(s) substrato(s) envolvido(s) permanece(m) parcialmente desconhecido(s).
O nó compacto é coberto por células de transição, que fornecem entradas (input) posteriores e anteriores, como também superficiais no lado direito e profundos no lado esquerdo. As células de transição também mostram morfologias intermediárias entre as células miocárdicas contráteis e àquelas do nó AV compacto.
Anatomia do Local do Óstio do Seio Coronário
A visão atrial direita desta área pode ser distorcida no que diz respeito à anatomia subjacente. Deve ser entendido que a verdadeira junção septal é muito pequena e mais atrioventricular do que interatrial (Figs. 1-1 e 1-2). Na verdade, o septo está presente apenas na pequena zona entre o septo membranoso (anteriormente) e o óstio do seio coronário (posteriormente). Além disso, o espaço juncional logo se expande para formar uma área de forma triangular, com uma base poligonal voltada para a superfície epicárdica inferior do coração. Portanto, ao nível do óstio do seio coronário, a área inferior a este ainda é, em parte, o septo AV muscular, e, em parte, a junção do septo interventricular com a parede livre atrioventricular posterior direita (Fig. 1-4). O conteúdo do componente celular, quando visto pelo lado atrial direito, é variável. Células de transição superficiais e profundas estão ainda presentes, freqüentemente separadas no meio por tecido adiposo (Fig. 1-5). O tecido adiposo se torna mais pronunciado, conforme caminhamos em direção posterior e, eventualmente, se funde ao tecido adiposo subepicárdico dos sulcos atrioventricular e interatrial (o local da crux do coração). Além deste aspecto arquitetônico, a morfologia celular é variável no sentido de que mais e mais células miocárdicas contráteis se misturam com as células de transição, de maneira que a fronteira entre as duas se torna indiferenciável.
O acesso nodal abaixo do seio coronário, que consiste de células miocárdicas contráteis, diminui anteriormente, de forma gradual, e se liga às células de transição. O acesso nodal através do septo sinusal, acima do óstio do seio coronário, consiste de grupos distintos de células miocárdicas de contração, orientados paralelamente, que em parte se ligam às células de transição superficiais e profundas, ao longo da área do nó AV compacto. Anteriormente, parte destas células se insere no corpo fibroso central, imediatamente acima e anterior ao local do feixe penetrante (His). Abaixo do óstio do seio coronário, a superfície atrial septal direita se acomoda sobre uma área de forma triangular com a sua base voltada para a superfície epicárdica que é intermediária à parte posterior do septo AV muscular. O músculo atrial que cobre este espaço é composto de células miocárdicas contráteis (o acesso abaixo do seio coronário) e de células de transição (profundas e superficiais) entre tecido fibroadiposo.
Variações na Morfologia Nodal
Dentro dos limites da estrutura anatômica básica ocorre uma extensa variação, mesmo entre os indivíduos dentro da mesma faixa etária. Por exemplo, o modo de desenvolvimento do nó compacto difere acentuadamente de um coração para outro. A morfologia no local de transição do nó compacto para o feixe (His) varia em conseqüência do modo de desenvolvimento do corpo fibroso central.
O nó compacto é coberto por células de transição que propiciam acessos posteriores e anteriores, como também superficiais (lado direito) e profundos (lado esquerdo). As células de transição também mostram morfologias intermediárias entre células miocárdicas de contração e as do nó AV compacto.
Esta variação afeta o grau de acesso das células de transição atrial anteriores ao interior do nó compacto. Além disso, o corpo fibroso central é altamente afetado por um processo degenerativo contínuo, relacionado à idade. Por exemplo, a parte atrioventricular do septo AV membranoso é quase inexistente no recém-nascido, mas bem distinto no adulto. Portanto, deve-se assumir que os acessos nodais anteriores à área juncional AV também são afetados. Finalmente, existe um aumento do tecido fibroadiposo relacionado à idade, que afeta todo o triângulo de Koch e , portanto, também, a zona de células de transição e as vias de acesso nodais posteriores. Existe uma variação acentuada na anatomia da área juncional AV especializada, de um indivíduo para outro, e em relação à idade.
Conclusões
1. O nó AV compacto se apresenta como uma continuidade do feixe penetrante (His) (esta é uma das contribuições fundamentais de Tawara(7) e fornece uma base para o conceito do feixe-nodal).
2. O nó AV compacto é coberto por uma zona de células de transição, que é o acesso para o feixe-nodal. Todavia, foi postulado, há muito tempo, baseado em observações clínicas13 e estudos experimentais em animais,14 que as células de transição podem estar envolvidas em produzir um retardo na condução atrioventricular. O termo nó atrioventricular, portanto, requer mais especificação.
3. A zona de células de transição apresenta um conteúdo heterogêneo do componente celular e o seu limite com as células miocárdicas contráteis é mal definido. Em verdade, não existe separação evidente entre o miocárdio contrátil e a zona de células transicionais. Além disso, não há evidência para a existência de feixes discretos penetrando no nó AV compacto.
4. Existe uma variação individual acentuada, como também uma variação relacionada à idade, que afeta a morfologia do nó compacto (especialmente nos prolongamentos posteriores), o local de transição entre o nó compacto e o feixe (His), a textura da zona de células de transição e a das proximidades do nó.
5. A área do óstio do seio coronário é parte do septo atrioventricular muscular e consiste de uma mistura de células de transição e de células miocárdicas de contração, que mostram diferenças na sua orientação em relação às partes superficiais e profundas. Superficialmente, as células tendem a ser orientadas em uma direção crânio-caudal, enquanto àquelas, nas áreas mais profundas, tendem a ser orientadas na direção póstero-anterior; esta última forma a conexão entre o acesso nodal abaixo do seio coronário e o nó compacto.
A relação topográfica entre feixe-nodal e as células de transição está esquematicamente resumida na Fig. 1-6.
Estas observações poderiam explicar a heterogeneidade dos eletrogramas registrados na área da superfície atrial direita, abaixo do óstio do seio coronário. A via "lenta" pode representar parte da entrada AV nodal normal, que, por razões ainda desconhecidas, pode se tornar parte do circuito de reentrada em pacientes com a chamada taquicardia por reentrada AV nodal.
Estas considerações, se olharmos adiante, podem questionar o conceito das duplas vias nodais como tratos "específicos" responsáveis pela chamada taquicardia por reentrada AV nodal. Pode ser que ambas as vias, rápida e lenta, registradas sob estas circunstâncias, estejam facilitadas por uma arquitetura especial, que em si mesma não é necessariamente anormal. Esta suposição é sustentada por algumas observações anatômicas. Existem dois estudos de corações de pacientes com taquicardia por reentrada AV nodal, mas em nenhum deles puderam ser detectadas anormalidades básicas.15,16 Além disso, um estudo recente de corações de pacientes nos quais uma dupla via nodal podia ser demonstrada, antes do transplante cardíaco, não mostrou qualquer anormalidade específica da área AV juncional no exame histológico.17
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Parte II - Conexões Atrioventriculares Acessórias
Robert H. Anderson Anton E. Becker
O nosso conhecimento sobre a estrutura dos tecidos de condução do coração encontra-se atualmente em uma encruzilhada. Permanece difícil aprimorar as descrições das disposições e dos aspectos morfológicos rudimentares destas estruturas, como foram estabelecidas pelos autores originais. Embora a descrição original do feixe penetrante atrioventricular feita por His1 fosse pouco esclarecedora,2 a expansão subseqüente deste trabalho, para incluir descrições do nó atrioventricular e dos tecidos de condução ventricular por Tawara, permanece um paradigma de investigação científica.3 Entretanto, as descrições iniciais do local e da estrutura do nó sinusal feitas por Keith e Flack,4 permanecem totalmente válidas. Na verdade, pode ser bem argumentado que os chamados avanços da era moderna acerca da anatomia rudimentar dos tecidos de condução, especialmente em relação à existência de vias de condução interatriais supostamente especializadas,5 têm tido passos retrógrados, quando considerados sob a luz do conhecimento, no final da primeira década do século 20. Nos últimos anos, todavia, avanços notáveis foram feitos na caracterização da natureza das células, nervos e componentes intracelulares, no interior dos tecidos de condução de animais.6,7
As técnicas da microscopia eletrônica e imunocitoquímicas têm sido utilizadas para estabelecer com mais precisão a presença de células especializadas, em contraste com as células miocárdicas contráteis.8,9 Estas técnicas, todavia, ainda não foram estabelecidas em humanos, trabalhos ainda devem ser desenvolvidos para que as pesquisas morfológicas mais recentes possam se correlacionar com os achados eletrofisiológicos. Portanto, neste capítulo, as nossas próprias interpretações da disposição e do arranjo celular dos tecidos de condução, como sugerido há algum tempo atrás, serão recapitulados.10-12 Será também desenvolvida uma revisão da nossa experiência sobre o exame histológico de substratos morfológicos potenciais para a síndrome de pré-excitação ventricular13,14
O Sistema de Condução do Coração
O sistema que gera o impulso cardíaco e o distribui por todo o miocárdio é composto de células especializadas que estão freqüentemente e intimamente integradas aos tecidos nervosos, mas são inequivocamente de natureza miocárdica (Fig. 1-7). O impulso é gerado dentro do nó sinusal ou sinoatrial, uma estrutura pequena em forma de charuto, localizada dentro do sulco terminal, do morfologicamente átrio direito. O impulso é conduzido através das paredes da massa miocárdica atrial, através dos miócitos atriais ordinários. Entretanto, ainda devem ser fornecidas evidências a nível microscópico15 para substanciar o conceito de tratos especializados que fariam conexão do nó sinusal com o nó atrioventricular.5 Após ter atravessado a massa miocárdica atrial, o impulso é retardado dentro do nó atrioventricular, antes de ser dissipado para o miocárdio ventricular, através dos tecidos de condução ventricular. O sistema de células que primeiro retarda e depois transmite o impulso é chamado de eixo de condução atrioventricular.11,16 Outros resquícios de células histologicamente especializadas são encontradas espalhadas ao redor dos orifícios das valvas atrioventriculares, especialmente da valva tricúspide. Elas não fazem nenhum contato com o miocárdio ventricular, mas têm significado histórico no que diz respeito à natureza das conexões atrioventriculares acessórias. Estas estruturas são resquícios do tecido anelar atrioventricular especializado.17 Igualmente importante na função normal do sistema de condução é a presença de um mecanismo de isolamento atrioventricular, que assegura que em todos os pontos, com exceção do ponto de penetração do eixo de condução atrioventricular, a massa muscular atrial ficaria eletricamente separada do miocárdio ventricular. Maiores considerações serão feitas sobre o arranjo morfológico de cada um destes componentes (Fig. 1-7).
O Nó Sinusal
O nó sinusal ou sinoatrial está situado imediatamente abaixo do epicárdio, dentro do sulco terminal (sulcus terminalis) do átrio direito. Esta é a junção do apêndice trabeculado com o componente venoso liso. Ela marca, internamente, o local da crista terminal (crista terminalis). Freqüentemente, em nove de dez casos, o nó está situado lateralmente à crista do apêndice e apresenta uma cauda que se estende para baixo, em direção ao orifício da veia cava inferior. Em um de dez casos, o nó se estende por cima da crista do apêndice assumindo a forma de uma ferradura com um braço se dirigindo para baixo, ao longo do sulco terminal e o outro para o interior do sulco interatrial (Fig. 1-8). Os tecidos do nó sinusal são geralmente dispostos ao redor de uma proeminente artéria nodal central, que tem sido envolvida como "servomecanismo" potencial.18 Embora seja uma sugestão atraente, esta proposta não deve ser literalmente interpretada, pois alguns corações não apresentam uma artéria nodal central e, contudo, funcionam de maneira exemplar. A artéria nodal é a mais proeminente de todas as artérias atriais e geralmente se origina das porções mediais das artérias direitas ou circunflexas. Mais raramente, ela pode se originar distalmente em relação a estes vasos ou até mesmo se originar no centro do coração.19-21 O seu percurso até o nó sinusal também é variável, tendo como opções a artéria percorrer à frente ou atrás do orifício da veia cava superior ou se bifurcar e formar um círculo arterial ao redor da junção cavoatrial.22
As células do nó são menores do que as células miocárdicas atriais e são posicionadas como uma massa triangular, com a sua base disposta contra a crista terminal e o seu ápice se estendendo para o interior da parede da veia cava superior (Fig. 1-9). As células nodais pequenas são dispostas em uma matriz fibrosa densa, já discernível na metade da gestação fetal.23 O conteúdo do tecido fibroso aumenta acentuadamente com a idade24 e a substituição das células nodais pelo processo fibrosante é uma das causas da síndrome da doença do nó sinusal.25
Estudos realizados em coelhos demonstraram que o marcapasso é desencadeado pela descarga sincronizada de um número relativamente grande de células nodais.26 As células envolvidas, um total de 5.000, são geralmente células nodais pequenas, embora em alguns casos o centro do marcapasso possa conter uma grande proporção de células de transição, com uma modificação concomitante na configuração da ação potencial. As células de transição, conforme o nome sugere, apresentam uma aparência morfológica intermediária entre as células nodais e os miócitos atriais de contração. Elas estão localizadas nas bordas do nó, com projeções se estendendo para o interior da musculatura da crista terminal. Este achado se correlaciona bem com os estudos eletrofisiológicos que mostram uma via de condução preferencial fora do nó sinusal e dentro da crista terminal.26 A fibrose, nestes locais, ou em qualquer outro local dos átrios, pode causar um bloqueio de saída e, portanto, pode fornecer um outro substrato para a disfunção do nó sinusal.
O Mecanismo de Condução Internodal
Debates e controvérsias têm envolvido as sugestões de que o impulso sinusal é conduzido ao nó atrioventricular através de "tratos especializados".5 A maior parte da discordância é mais proveniente de argumentos semânticos do que científicos.27 É suficiente dizer que, em termos de observações anatômicas, os tratos de tecidos histologicamente especializados comparados ao eixo de condução atrioventricular (o paradigma de um sistema desenhado para a condução) ainda têm que ser demonstrados entre os nós cardíacos.15 Os tecidos miocárdicos entre os nós são compostos de miócitos atriais de contração, embora com acentuada heterogeneidade tanto eletrofisiológica como ultra-estrutural. A condução preferencial, que indubitavelmente ocorre, é a conseqüência da disposição anatômica e do agrupamento destas células atriais de contração.28
Os Tecidos Especializados do Anel Atrioventricular
Tanta controvérsia como as que envolvem os substratos da condução internodal tem sido gerada em relação aos achados de Kent.29-35 Kent estava preocupado, durante todo o seu trabalho, em estabelecer a existência de múltiplas conexões musculares através da junção atrioventricular em um coração normal. Ele acreditava que estas múltiplas conexões eram responsáveis pela condução atrioventricular normal e que as conexões laterais poderiam sustentar esta condução, mesmo depois da destruição do feixe penetrante atrioventricular. Kent estava inequivocadamente errado. Todavia, isto não deve sugerir que as suas observações histológicas não tivessem fundamento. Os resquícios em forma de nó, por ele ilustrados em vários de seus trabalhos (Fig. 1-10A), não existem. Eles são os resquícios de um anel inicialmente extenso do tecido atrioventricular especializado, que circunda a junção atrioventricular no desenvolvimento do coração humano (Fig. 1-10B). Entretanto, o desenvolvimento normal ocorre de tal forma a seqüestrar os resquícios deste anel dentro do segmento distal do miocárdio atrial, conforme ele se insere na junção atrioventricular.17 Nós não temos conhecimento de qualquer exemplo de um coração normal, no qual os resquícios do tecido especializado do anel atrioventricular tenha demonstrado produzir uma conexão atrioventricular muscular. Foi um achado surpreendente que o substrato para pré-excitação de Wolf-Parkinson-White tenha demonstrado ser conexões atrioventriculares musculares acessórias e que a arritmia poderia ser explicada com base nas múltiplas conexões postuladas por Kent, podendo existir no coração normal.
Os Mecanismos de Isolamento Atrioventricular
A condução normal no interior do coração só pode ocorrer quando a massa muscular atrial estiver isolada da musculatura ventricular em todos os pontos, exceto no local da penetração do eixo de condução atrioventricular. Acredita-se que este isolamento seja proporcionado pelo esqueleto cardíaco, formado pela conjunção de quatro "anéis" de tecido colagenoso que sustenta os folhetos das valvas cardíacas. Esta noção não tem qualquer base anatômica. As valvas não apresentam qualquer "anel" colagenoso; as suas cúspides são fixadas de forma semilunar através das junções ventriculoarteriais, sendo sustentadas em parte pela musculatura ventricular e em parte pelos tecidos fibrosos das paredes arteriais. Os anéis colagenosos bem desenvolvidos ao redor das junções atrioventriculares são uma exceção mais importante do que a regra. Os folhetos da válvula mitral são sustentados por tecidos fibrosos que também separam a massa muscular ventricular da atrial, mas este tecido fibroso é freqüentemente disposto em forma de folha de papel, ao invés de um cordão anelar.36 Os folhetos da válvula tricúspide são raramente sustentadas por um "anel" fibroso. Ao invés disso, ocorre uma invaginação mais profunda do sulco atrioventricular, com os tecidos atriais se estendendo para o interior dos folhetos da válvula tricúspide (Fig. 1-11). A separação das massas musculares é geralmente atingida pelo tecido fibroadiposo do sulco, ao invés de pelo "esqueleto fibroso". De forma semelhante, as massas musculares septais são geralmente separadas umas das outras pelo plano do tecido fibroadiposo epicárdico, que se estende por baixo do seio coronário, carregando a artéria ao nó atrioventricular. É extremamente raro a presença de uma lâmina fibrosa completa entre a musculatura atrial e a ventricular, dentro do septo atrioventricular. Ao contrário de algumas opiniões37 as nossas observações sugerem que as estruturas septais não se estendem anteriormente ao componente interventricular do septo membranoso. O chamado septo anterior37 é, na realidade, a crista supraventricular do ventrículo direito (Fig. 1-12).
O Eixo de Condução Atrioventricular
No coração bem formado, a massa muscular atrial é isolada do miocárdio ventricular em todos os pontos, exceto no local de penetração do eixo de condução atrioventricular. Todavia, o eixo, por si só, apresenta uma estrutura complicada. Ele se origina dentro dos tecidos atriais, se estende através das estruturas fibrosas isolantes e, então, se dirige em direção inferior às estruturas septais ventriculares, antes de se ramificar no interior do miocárdio ventricular. Através da maior parte de seu percurso, suas fibras são isoladas dos tecidos miocárdicos adjacentes. O eixo é convencionalmente descrito em termos de partes componentes,11,16 embora funcione como um todo.
A parte atrial do eixo está contida exclusivamente dentro do triângulo de Koch, sendo este o marco atrial direito do septo muscular atrioventricular. O triângulo, propriamente dito, é delimitado superiormente pelo tendão de Todaro (a continuação dentro da musculatura septal da comissura das valvas da veia cava inferior e do seio coronário), inferiormente, pelo local de fixação da cúspide septal da valva tricúspide e, posteriormente, pelo óstio do seio coronário (Fig. 1-13). A parte mais evidente do segmento atrial do eixo é o nó atrioventricular compacto, um conjunto de células semi-ovais dispostas contra o plano isolante de tecido fibroadiposo (Fig. 1-14A). Zonas de células de transição são interpostas entre o nó compacto e os tecidos miocárdicos atriais e se ligam à musculatura atrial ao redor da abertura do seio coronário e também à musculatura septal do septo sinusal. As células de transição se nutrem no interior da parte posterior do nó e também formam fibras sobrepostas que se estendem sobre o nó e continuam até atingir o ponto de inserção do folheto septal da válvula tricúspide. Como um todo, as células de transição se interpõem tanto entre o lado direito como entre o esquerdo do septo, enfatizando que o nó é uma estrutura interatrial, ao invés de ser uma estrutura atrial direita.38 O feixe de condução continua além do nó compacto, como o feixe penetrante atrioventricular (Fig. 1-14B). A transição entre estes segmentos é o ponto no qual o eixo penetra no interior dos tecidos isolantes do corpo fibroso central.11 Em termos de tamanho e disposição das células, é difícil fazer uma distinção entre estas partes do eixo, sendo as células na maior parte pequenas e entrelaçadas. Uma vez dentro do ventrículo, as células do feixe se tornam de certa forma maiores e orientadas paralelamente, embora ainda sejam de um tamanho comparável ao das células miocárdicas ventriculares de contração. O feixe atravessa um percurso relativamente curto no interior do ventrículo, antes de se ramificar em relação ao septo muscular (Fig. 1-14C).
Algumas vezes, este segmento é de dimensão suficiente para permitir que seja descrito como o feixe não ramificado. Em outros corações, o feixe começa a se ramificar tão logo penetre. De qualquer forma, uma vez iniciado, o processo de ramificação apresenta um aspecto característico. O segmento ramificado do feixe está localizado ou na crista do septo muscular, ou no seu lado esquerdo, dependendo da presença de uma margem posterior bem desenvolvida do septo marginal trabeculado. Os fascículos do ramo esquerdo do feixe desliza pela superfície lisa do lado esquerdo do septo interventricular e, inicialmente, uma estrutura contínua se divide em três partes como um leque,3 embora possa existir uma variação considerável em relação à arquitetura divisional. O ramo direito do feixe penetra no interior do septo, geralmente acima do ponto de origem do último fascículo do feixe esquerdo, e então penetra no interior do septo em forma de cordão, para emergir abaixo do músculo papilar medial da válvula tricúspide. O feixe direito então percorre em direção à estrutura do septo marginal trabeculado (banda septal), antes de se ramificar no ápice do ventrículo, com um de seus ramos atravessando o interior da banda moderadora do músculo papilar anterior da válvula tricúspide. Através de toda a extensão dos ramos ventriculares, as fibras de condução são isoladas do miocárdio ventricular por bainhas de tecido fibroso. Dentro destas bainhas, as células de condução permanecem com um tamanho que é comparável ao das células de contração ventriculares. As células maiores de Purkinje não são características dos tecidos de condução humano. É difícil detectar no coração humano as fibras de condução, uma vez que elas tenham perdido a sua bainha de isolamento. Portanto, a natureza exata das ramificações terminais dos ramos do feixe permanece incerta. Estudos utilizando técnicas imunocitoquímicas e microscopia eletrônica em corações de animais demonstraram estágios transitórios entre as células do feixe de condução e as células de contração do miocárdio ventricular.9
Embora a extensão ventricular do feixe seja bem isolada da massa miocárdica ventricular, a situação não é bem definida na transição atrioventricular. Aqui, tanto na superfície inferior do nó compacto como no início do feixe penetrante, lâminas de tecido nodal se estendem para o centro do corpo fibroso. Em alguns corações aparentemente normais, estas lâminas podem ser detectadas histologicamente para estabelecer a continuidade do coração, desde a massa muscular atrial até a ventricular. Quando observadas juntas, as lâminas (ou arquipélagos) formam as chamadas fibras paraespecíficas ou fibras de Mahaim.39 Elas são uma característica de corações normais, assim como o achado ocasional de cordões de tecido se estendendo para fora dos ramos do feixe, para se ramificar dentro da crista do septo ventricular.
A função global do feixe de condução não é somente conduzir o impulso sinusal aos ventrículos, assegurando uma contração ventricular coordenada, mas também retardar o impulso para dar tempo ao enchimento ventricular. A análise de corações de animais sugere que a maior parte do retardo é induzido dentro das zonas de transição do feixe, com um incremento adicional produzido no nó compacto.40 Em relação à pré-excitação, é importante reconhecer que um incremento adicional do tempo de condução atrioventricular ocorra quando o impulso atravessa os segmentos isolados do feixe, dentro da massa ventricular.
Os Substratos para a Pré-excitação Ventricular
Qualquer estrutura que ultrapasse parte do tempo gasto durante a condução normal através do feixe de condução atrioventricular pode resultar em uma pré-excitação ventricular.13,41 A forma clássica da pré-excitação de Wolff-Parkinson-White é causada por uma conexão (ou conexões) atrioventricular acessória, que atravessa o plano de isolamento atrioventricular em algum ponto fora do feixe especializado. Existem outras vias anatômicas que podem potencialmente causar um curto circuito em parte do retardo atrioventricular total.13 As fibras paraespecíficas podem ser indevidamente proeminentes e funcionar tanto como conexões nodoventriculares como fasciculoventriculares. Um ou dois exemplos de que estas estruturas possam estar envolvidas nos circuitos que produzem pré-excitação foram demonstradas através de correlações histofisiológicas.42,43
As fibras que se originaram no interior dos tecidos atriais foram descritas como passando, através do colar fibroso que circula o feixe atrioventricular penetrante, para produzir conexões atriofasciculares.44 Estas conexões produzem pré-excitação com um intervalo P-R curto, mas com um complexo QRS normal. Também é possível que possam existir vias alternativas dentro do nó atrioventricular para produzir este modelo de pré-excitação; todavia, estas vias alternativas, ou as rotas para aceleração da condução atrioventricular nodal, ainda não foram demonstradas anatomicamente. Os potenciais morfológicos são vários. Apesar destas vias alternativas (Fig. 1-15), a maioria do conhecimento anatômico tem crescido naturalmente em relação às conexões atrioventriculares musculares acessórias, responsáveis pela síndrome de Wolff-Parkinson-White. Sabe-se que estes feixes podem existir potencialmente em qualquer ponto ao redor da junção atrioventricular. Isto se deve ao fato das massas musculares atrial e ventricular terem estado, inicialmente, em continuidade muscular através da extensão do canal atrioventricular em desenvolvimento. No coração totalmente formado, as conexões que persistem podem ser subdivididas naquelas que ocorrem dentro da junção esquerda, naquelas que ocorrem dentro do septo atrioventricular e naquelas que ocorrem dentro da junção direita (veja a Fig. 1-12). As conexões do lado esquerdo são quase sempre encontradas em algum ponto ao redor do local de fixação da cúspide mural da válvula mitral,44 embora, muito raramente, elas possam ser encontradas na área de continuidade fibrosa mitro-aórtica.45 As cone-xões encontradas em relação à cúspide mural apresentam um aspecto morfológico característico. Elas se originam da porção epicárdica do miocárdio atrial, atravessam o tecido fibroadiposo do sulco atrioventricular freqüentemente em relação íntima com o local fibroso de fixação da cúspide da válvula mitral e se insere sobre a superfície epicárdica da massa muscular ventricular (Fig. 1-15). Este modelo foi descrito de forma exemplar por Ohnell.46 Este arranjo não tem qualquer semelhança com as estruturas juncionais descritas por Kent.29-34 Não há qualquer justificativa em descrever as conexões musculares que produzem a pré-excitação clássica, como "feixes de Kent".47 As conexões musculares são feitas de células miocárdicas de contração, são mais espessas na sua origem atrial, atravessam obliquamente através do plano de tecido fibroadiposo (freqüentemente acompanhados de um feixe neurovascular) e, algumas vezes, se ramificam conforme se inserem no miocárdio ventricular.44 A sua ocorrência em associação com a cardiomiopatia hipertrófica, prolapso da válvula mitral e algumas anomalias cardíacas congênitas (especialmente a má formação de Ebstein da valva tricúspide e transposição corrigida congenitamente) é mais freqüente do que se esperava. Um tipo específico de conexão muscular do lado esquerdo foi observada em algumas ocasiões em associação com extensões aneurismáticas do seio coronário.48
As conexões septais percorrem a área do septo atrioventricular muscular fora dos limites do eixo especializado. Potencialmente, estas conexões poderiam estar localizadas do lado direito ou esquerdo. Nós estudamos, histologicamente, um exemplo em um coração com má-formação de Ebstein, em que a conexão atravessou o plano de tecido fibroso no ponto antecipado da inserção do folheto septal da válvula tricúspide.44 Estas conexões atravessam o plano de tecido fibroadiposo encontrado abaixo da abertura do seio coronário. Este plano é favorável à dissecção direta37 ou pode ser modificado pela criotermia ao longo da superfície atrial direita do septo atrioventricular.(Fig. 1-16)
As conexões acessórias do lado direito podem existir em qualquer ponto ao redor do orifício tricúspide, desde abaixo da abertura do seio coronário, até a extensão anterior da crista supraventricular. A primeira conexão histologicamente demonstrada foi no sulco atrioventricular direito.49 Pesquisas morfológicas subseqüentes acerca das conexões do lado direito são limitadas.44,50,51 Uma conexão muscular interessante foi encontrada dentro das paredes de um aneurisma venoso.51 Talvez sejam de maior interesse as conexões do lado direito, que se originam dos nós de Kent (Fig. 1-17). Uma conexão deste tipo foi encontrada em uma série de pacientes estudados histologicamente44 e as conexões descritas recentemente por Guiraudon e associados52 provavelmente coincidem com este grupo. O significado eletrofisiológico preciso da sua estrutura especializada, em contraste com a natureza contrátil da maioria das conexões musculares acessórias, ainda está para ser totalmente estabelecida.
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