Capítulo 13 - Hipertensão Pulmonar
Capítulo 13 - Hipertensão Pulmonar
A determinação da pressão da artéria pulmonar faz parte da rotina do exame ecocardiográfico, uma vez que ela reflete a gravidade das doenças que acometem o lado esquerdo do coração (p. ex., regurgitação mitral, estenose mitral, disfunção sistólica do ventrículo esquerdo), possibilita o prognóstico e é uma medida da hipertensão pulmonar. Apesar de certos achados ecocardiográficos bidimensionais sugerirem hipertensão pulmonar, a ecocardiografia Doppler é a principal maneira de determinar as pressões pulmonares verdadeiras. As pressões sistólica e diastólica da artéria pulmonar são determinadas a partir das velocidades de regurgitação tricúspide e pulmonar, respectivamente. A ecocardiografia transesofágica (TEE) possibilita uma excelente visualização das artérias pulmonares em seu tronco, à direita, e da parte proximal do ramo esquerdo, e assim é útil na detecção do tromboembolismo da artéria pulmonar.
Ecocardiografia Bidimensional
A hipertensão pulmonar é facilmente reconhecida quando os seguintes achados da ecocardiografia de modo-M e bidimensional estão presentes [1-4] (Figs. 13-1 e 13-2):
1. Onda "a" (atrial) diminuída ou ausente da valva pulmonar
2. Fechamento mesodiastólico ou "entalhamento" da valva pulmonar
3. Câmaras cardíacas direitas aumentadas
4. Cavidades do ventrículo esquerdo em formato de D devido a achatamento do septo intraventricular
Entretanto, esses achados não são sensíveis para hipertensão pulmonar. Eles são qualitativos e não fornecem dados hemodinâmicos reais.
Ecocardiografia Doppler
A ecocardiografia Doppler permite a estimativa da pressão da artéria pulmonar pela medida da velocidade de regurgitação tricúspide, do tempo de aceleração na via de saída do ventrículo direito e da velocidade de regurgitação pulmonar.
Velocidade de Regurgitação Tricúspide
A velocidade de regurgitação tricúspide reflete a diferença de pressão entre o ventrículo direito e o átrio direito [5-7] (Fig. 13-3). Assim sendo, a pressão sistólica do ventrículo direito pode ser estimada pela adição da pressão atrial direita ao gradiente transtricúspide derivado da velocidade da regurgitação tricúspide (ou seja, gradiente de pressão transtricúspide - 4 X velocidade de regurgitação tricúspide2). A pressão do átrio direito pode ser estimada clinicamente pela medida da pressão venosa jugular ou pela movimentação respiratória da veia cava inferior (IVC) observada nos ecocardiogramas bidimensionais. Quando o diâmetro da veia cava inferior diminui em cerca de 50% ou mais com a inspiração (Fig. 13-3C), a pressão do átrio direito é geralmente menor do que 10 mmHg, e aqueles com menos de 50% de colapso inspiratório tendem a ter pressão do átrio direito de 10 mmHg ou maiores [8]. Entretanto, a correlação com cateterismo cardíaco e seus valores demonstra que a adição de uma constante empírica (como, por exemplo, a pressão no átrio direito) fornece um valor satisfatório: 14, quando a pressão venosa jugular é normal, e 20, quando a pressão venosa jugular está elevada [6]. Na ausência de estenose pulmonar, a pressão sistólica do ventrículo direito é igual à pressão sistólica da artéria pulmonar. A velocidade normal de regurgitação tricúspide é de 2,0 a 2,5 m/s. Uma velocidade mais elevada indica tanto hipertensão pulmonar como estenose pulmonar (Fig. 13-4). A velocidade de regurgitação tricúspide pode ser inferior a 2,0 m/s quando existe uma quase equalização de pressões entre o átrio direito e o ventrículo direito na insuficiência tricúspide grave. A regurgitação tricúspide está presente em mais de 75% da população adulta normal. Quando o jato de regurgitação tricúspide é pequeno e seu espectro Doppler de onda contínua é subótimo, a injeção de uma solução salina agitada em uma veia do braço melhora o sinal da velocidade de regurgitação tricúspide.
Aspectos Técnicos
Os registros de velocidade Doppler da estenose aórtica e da regurgitação mitral podem assemelhar-se ao jato de regurgitação tricúspide. Todos os três jatos Doppler se movem para longe do ápex, mas eles podem ser diferenciados pela angulação do transdutor, pela velocidade de pico Doppler, pela duração do fluxo e pelo sinal diastólico que o acompanha. A regurgitação tricúspide se dirige mais medialmente, e a velocidade de influxo tricúspide (diástole) é geralmente menor do que 0,5 m/s, a não ser que a insuficiência tricúspide seja grave. A duração do fluxo é mais curta na estenose aórtica. A velocidade de pico do jato da regurgitação mitral é geralmente (mas nem sempre) maior do que 4 m/s e sempre maior do que aquele da estenose aórtica no mesmo paciente (ver Cap. 7, Fig. 7-12).
Tempo de Aceleração do Fluxo na Via de Saída do Ventrículo Direito
Tem sido demonstrado que o fluxo na via de saída do ventrículo direito tem um padrão característico à medida que a pressão da artéria pulmonar aumenta (Fig. 13-5). A fase de aceleração se torna mais curta com a pressão da artéria pulmonar aumentada. Vários investigadores conseguiram obter equações de regressão para estimar a pressão média da artéria pulmonar (MPAP) a partir do tempo de aceleração na via de saída do ventrículo direito (AcT)[9,10]
Log10 (MPAP)= -0,0068 (AcT) + 2,1 (Kitabatake et al. [10])
MPAP = 79 - 0,45 (AcT) (Mahane et al. [9])
A equação de Mahan é mais simples e é preferida para estimar a pressão média na artéria pulmonar. Deve ser observado, entretanto, que o tempo de aceleração depende do débito cardíaco e da freqüência cardíaca [11]. Na medida em que o débito cardíaco aumenta através das câmaras cardíacas direitas (como, por exemplo, na comunicação interatrial), o tempo de aceleração pode ser normal, mesmo quando a pressão da artéria pulmonar está elevada. Se a freqüência cardíaca é menor do que 60 ou está acima de 100 batimentos/min, o tempo de aceleração precisa ser corrigido a partir da freqüência cardíaca.
Velocidade de Regurgitação Pulmonar
A velocidade diastólica final da regurgitação pulmonar (PR) reflete o gradiente da pressão diastólica final entre a artéria pulmonar e o ventrículo direito (Figs. 13-6 e 13-7). No final da diástole, a pressão do ventrículo direito deve ser igual à pressão do átrio direito (RAP). Assim sendo,
PAEDP = 4 x EDV2 PR + RAP
onde PAEDP = pressão diastólica final da artéria pulmonar, e
EDV = velocidade diastólica final.
O gradiente de pressão de pico determinado por Doppler na artéria pulmonar e no ventrículo direito a partir do pico precoce na regurgitação pulmonar diastólica é útil para estimar a pressão média da artéria pulmonar. De acordo com Masuyama e colegas [12] este gradiente de pressão se aproxima da pressão média da artéria pulmonar (PAP). Assim sendo,
PAP média = 4 X velocidade de pico de PR2
Utilizando-se os múltiplos parâmetros Doppler citados, podem-se estimar as pressões pulmonares sistólica, diastólica e média. Felizmente, as regurgitações tricúspide e pulmonar estão presentes em mais de 85% dos pacientes normais. A incidência é maior em pacientes com hipertensão pulmonar. O sinal da velocidade de regurgitação tricúspide é aumentado pela injeção de um agente de contraste no átrio direito através de uma veia no braço direito. Uma vez a ecocardiografia tenha estabelecido uma pressão de artéria pulmonar elevada, suas causas potenciais devem ser avaliadas através da ecocardiografia bidimensional com Doppler e imagem de fluxo a cores para observação da existência de alterações na parte esquerda do coração (falência do ventrículo esquerdo, estenose mitral, insuficiência mitral, etc.), shunt esquerda-direita, defeito do septo interatrial, defeito do septo interventricular, cor pulmonale ou embolismo pulmonar. Fig 13-8
Cor Pulmonale e Embolismo Pulmonar
Ecocardiografia Transtoráica
Pode ser difícil a distinção entre o cor pulmonale agudo (ou seja, embolismo pulmonar) e a doença pulmonar obstrutiva crônica. A hipertrofia do ventrículo direito é comum na sua forma crônica. Em ambas as formas, câmaras cardíacas estão dilatadas e existem evidências bidimensionais e ao Doppler de um aumento da pressão no ventrículo direito, como descrito anteriormente. A cavidade do ventrículo esquerdo é relativamente pequena e hiperdinâmica, a não ser que patologias cardíacas esquerdas estejam também presentes. A Figura 13-9 mostra a imagem congelada de um ecocardiograma subcostal bidimensional de um paciente que teve um colapso hemodinâmico após cirurgia ortopédica. As câmaras cardíacas direitas estão dilatadas e o septo interventricular está desviado para a esquerda devido a aumento da pressão do ventrículo direito causado por tromboembolismo pulmonar agudo.
Ocasionalmente, trombos em trânsito são detectados nas câmaras cardíacas direitas [13]. Eles são altamente móveis e têm a aparência de uma pipoca ou de uma cobra (Figs. 13-10 e 13-11). A massa móvel surge de uma embolização em bloco de trombos venosos. Os pacientes inevitavelmente apresentam embolismo pulmonar e devem ser tratados rigorosamente com agentes anticoagulantes, terapêutica trombolítica, ou até mesmo por remoção cirúrgica. O mesmo tipo de material de trombo é responsável por êmbolos paradoxais quando o forame oval está patente (ver Cap. 14). Na Clínica Mayo, tratamos com sucesso trombos móveis do átrio direito usando o seguinte esquema trombolítico: estreptocinase, 250.000 unidades em bolus, seguidas por 100.000 unidades/hora por infusão contínua. Os trombos do átrio direito geralmente se dissolvem dentro de 24 a 48 horas. Os resultados terapêuticos são monitorados por ecocardiogramas repetidos. Quando existem trombos no átrio esquerdo devido a embolismo paradoxal, a terapêutica trombolítica está contra-indicada e a remoção cirúrgica é um tratamento mais eficaz.
Ecocardiografia Transesofágica
A principal artéria pulmonar e sua bifurcação em ramos direito e esquerdo são também bem visualizadas pela ecocardiografia transesofágica. Trombos na parte proximal da artéria pulmonar podem ser detectados com facilidade pela TEE (Fig. 13-12). Como mostra a Figura 13-11, os trombos em trânsito nas câmaras cardíacas direitas são também facilmente visualizados pela TEE. Quando a ecocardiografia transtorácica não é capaz de caracterizar uma massa intracardíaca direita, a TEE deve ser considerada. Um recente estudo demonstrou que a TEE detectou tromboembolismo pulmonar central em 35 (58%) de 60 pacientes com tromboembolismo pulmonar grave, a maior parte deles na artéria pulmonar direita [14]. Apesar de ser mais difícil a visualização da artéria pulmonar esquerda pela TEE, mesmo no plano longitudinal, a sensibilidade da TEE na detecção do tromboembolismo pulmonar é de 97%, usando-se a angiografia pulmonar, a tomografia computadorizada, a autópsia, ou a cirurgia como um padrão de referência.
Quando a pressão do átrio esquerdo está mais elevada, pode existir um shunt significativo direita-esquerda através de um forame oval permeável, levando a hipoglicernia acentuada. Uma vez que todo o septo intra-atrial é claramente visualizado na TEE, os pacientes com hipoxemia refratária, no caso de pressão atrial direita elevada, devem ser submetidos a um contraste transesofágico e a um exame ecocardiográfico de fluxo a cores (Fig. 13-13).
Referências
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2. Goodman DJ, Harrison DC, Popp RL. Echocardiographic features of primary pulmonary hypertension. Am J Cardiol 1974;33:438-443.
3. Nanda NC, et al. Echocardiographic evaluation of pulmonary hypertension. Circitlation 1974; 50:575-581.
4. Lew W, Karliner JS. Assessment of pulmonary valve echogram in normal subjects and in patients with pulmonary arterial hypertension. Br Heart 11979; 42:147-161.
5. Yock PG, Popp RL. Noninvasive estimation of right ventricular systolic pressure by Doppler ultrasound in patients with tricuspid regurgitation. Circidation 1984;70:657-662.
6. Currie, PJ, et al. Continuous wave Doppler determination of right ventricular pressure. A simultaneous Doppler catheterization study in 127 patients. J Am Coll Cardiol 1985;6:750-756.
7. Hatle L, Angelsen BAJ, Tromsdal A. Noninvasive estimation of pulmonary artery systolic pressure with Doppler ultrasound. Br Heart 1981;45:157.
8. Kircher BJ, Himelman RB, Schiller NB. Noninvasive estimation of right atrial pressure from the inspiratory collapse of the inferior vena cava. Am J Cardiol 1990;66:493-496.
9. Mahan G, et al. Estimation of pulmonary artery pressure by pulsed Doppler echocardiography (Abstract). Circidation 1983;68(suppl 111):367.
10. Kitabatake A, et al. Noninvasive evaluation of pulmonary hypertension by a pulsed Doppler technique. Circtilation 1983;68:302-309.
11. Chan KL, et al. Comparison of three Doppler ultrasound methods in the prediction of pulmonary artery pressure. J Am Coll Cardiol 1987;9:549-554.
12. Masuyama T, et al. Continuous-wave Doppler echocardiographic detection pulmonary regurgitation and its application to non-invasive estimation of pulmonary artery pressure. Circtilation 1986;74:484.
13. Proano M, et al. Successful treatment of pulmonary embolism and associated mobile right atrial thrombus with use of a central thrombolytic infusion. Mayo Clin Proc 1988;63:1181-1185.
14. Wittlich N, et al. Detection of central pulmonary artery thromboemboli by transesophageal echocardiography in patients with severe pulmonary embolism. J Am Soc Echocardiogr 1992;5:515-524
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