Capítulo 05 - Captação dos Vetores do Galvanômetro
Capítulo 05 - Captação dos Vetores do Galvanômetro
José Hallake
Introdução
Todos os vetores estudados - o da onda P, os quatro da despolarização ventricular e o da onda T - serão captados pelo galvanômetro. Em realidade. o é vai ser captado são as projeções desses vetores em dois planos utilizados pela eletrocardiografia: o plano frontal e o plano horizontal (Fig. 5-1). Devemos imaginar que todos esses vetores tenham origem no centro elétrico do cada um a seu tempo.
Plano Frontal
Derivações Bipolares
O plano frontal é paralelo ao tórax do indivíduo (Fig. 5-2). Nesse plano, Einthoven imaginou a presença de um triângulo equilátero, cujos lados denominou D1, D2 e D3, conhecidos como as três derivações bipolares do plano frontal (Fig. 5-3).
Como o triângulo é equilátero, podemos determinar seu (entro geométrico, que em eletrocardiografia é chamado de centro elétrico do coração, bastando para isso que se trace as bissetrizes dos ângulos desse triângulo. Essas bissetrizes passam pelo centro elétrico do coração e dividem o lado oposto em dois segmentos iguais, um positivo e outro negativo (Fig. 5-4). Einthoven ligou os pólos do galvanômetro aos ângulos do triângulo, formando três derivações (Fig. 5-5): ombros esquerdo e direito (D1), ombro direito e perna esquerda (D2) e ombro e perna esquerdos (D3).
Qualquer vetor que tenha origem no centro geométrico desse triângulo poderá ser projetado em D1, D2 e D3. Assim, o vetor V projetado em D1 dará segmento g; projetado em D2 dará o segmento h, e em D3, o segmento i (Fig. 5-6). Einthoven convencionou que qualquer vetor projetado nos segmentos b, e, d, de D1, D2, e D3, respectivamente, fosse interpretado como positivo; e projetado nos segmentos a, f, c, de D1, D2 e D3, respectivamente, fosse interpretado como negativo (Fig. 5-4). Assim, na Fig. 5-6, o segmento g, que representa projeção do vetor V em D1, será positivo; o segmento h, que representa projeção do vetor V em D2, será também positivo, bem como o segmento i, que representa a projeção do vetor V em D3.
Observamos, também, que a magnitude dos segmentos g, h e i depende da inclinação do vetor V em relação a D1, D2 e D3: quanto mais próximo de ser paralelo, maior será a magnitude da projeção, e, quanto mais próximo da perpendicular, menor a projeção, até a situação de rigorosamente perpendicular, na qual a projeção será um ponto.
Portanto, qualquer vetor no plano frontal poderá ser projetado nessas três linhas e derivação, e será representado por positividade, negatividade ou não terá expressão elétrica (quando for perpendicular à linha de derivação).
Captação do Vetor P pelas Derivavações Bipolares do Plano Frontal
Como vimos, o vetor P é orientado para baixo, para a esquerda e para a frente. Evidentemente, a projeção desse vetor no plano frontal ignora sua situação espacial de ser para a frente. Vendo a projeção, só podemos concluir que ele está para baixo e para a esquerda (Fig. 5-7).
Todos os vetores de ativação dos átrios, dos ventrículos e também o da repolarização ventricular podem ser admitidos como partindo do centro geométrico do triângulo de Einthoven. Assim, o vetor P, projetado no triângulo de Einthoven, será positivo nas três derivações, desenhando em cada uma delas uma onda P positiva (Fig. 5-8).
Captação dos Quatro Vetores de Ativação Ventricular pelas Derivações Bipolares do Plano Frontal
Como vimos, as quatro etapas da despolarização ventricular (terço médio do septo interventricular, terço inferior do septo interventricular, paredes livres dos ventrículos e porções basais) podem ser representadas pelos quatro vetores que se sucedem imediatamente e que podem partir de um mesmo ponto, que é o centro elétrico do coração e o centro geométrico do triângulo de Einthoven. A Fig. 5-9 mostra a projeção dos quatro vetores da ativação ventricular no triângulo de Einthoven. Observamos que todos partem do centro elétrico do coração.
Esses vetores também podem ser captados pelo galvanômetro, segundo suas projeções nas derivações D1, D2 e D3.
Vejamos em D1 (Fig. 5-10): o primeiro vetor, localizado para a direita, para baixo e para a frente (a projeção no plano frontal não nos permite (fizer se o vetor está para a frente ou para trás) terá uma projeção negativa em D1, que tio eletrocardiograma dará um registro negativo. O segundo vetor, dirigido para a esquerda, para baixo e para a frente, terá uma projeção positiva em D1, que no eletrocardiograma será um registro positivo.
O terceiro vetor, orientado para a esquerda, para baixo e para trás, terá uma projeção positiva em D1, maior do que a do segundo vetor. No eletrocardiograma, será representado por uma positividade mais ampla.
O quarto vetor, voltado para cima, para trás e, neste exemplo, para a direita (sabemos que também pode estar para a esquerda ou na linha média), terá uma projeção negativa em D1, que no eletrocardiograma se mostrará como uma deflexão negativa. Observamos que a projeção desse quarto vetor em D1, é menor do que a do primeiro vetor e, por isso, no eletrocardiograma, a primeira deflexão negativa é mais profunda que a segunda.
Construímos, assim, o traçado eletrocardiográfico resultante da projeção dos quatro vetores de ativação ventricular na derivação bipolar D1.
À semelhança da curva eletrocardiográfica de atividade dos átrios, que chamada de onda P, o traçado eletrocardiográfico, que representa a atividade ventricular, tem também nomenclatura própria:
as ondas positivas são chamadas de R.
as ondas negativas, antes da onda R, são denominadas Q e, quando seguem, ondas S.
Quando o complexo ventricular é constituído apenas de uma onda ele é designado de QS.
As letras serão maiúsculas se representarem ondas de maior amplitude (R) ou maior profundidade (S ou Q) e minúsculas, caso contrário (Fig. 5-11).
Havendo mais de uma onda com a mesma designação, a segunda é distinguida com apóstrofo: exemplo: r-r` (Fig. 5-12).
Do mesmo modo, os quatro vetores da ativação ventricular também podem ser projetados em D2 e D3 (Fig. 5-13 para D2 e Fig. 5-14 para D3).
Captação do Vetor T pelas Derivações Bipolares do Plano Frontal
Como vimos, o vetor T é orientado para baixo, para a esquerda e para a frente. Assim, o vetor T projetado no triângulo de Einthoven será positivo nas três derivações, desenhando em cada uma delas uma onda T positiva (Fig. 5-15).
Derivações Unipolares dos Membros
Wilson, em 1934, com a finalidade de obter um potencial de aproximadamente zero no pólo negativo do galvanômetro, idealizou um dispositivo chamado de central terminal, que reúne os três eletrodos das derivações clássicas. O outro pólo do galvanômetro, o positivo, estaria ligado ao eletrodo a ser colocado nos ângulos do triângulo de Einthoven (Fig. 5-16A, 5-16ac1, 5-16Ac2 [ 1 a 3]).
Todas as derivações que utilizam a central terminal de Wilson são designadas pela letra V (voltagem). Wilson designou as derivações unipolares dos membros por VR, VI, e VF, nas quais o pólo positivo ficava respectivamente no braço direito, no braço esquerdo e na perna esquerda, adotando a nomenclatura e inglês right, left, e foot). Como as deflexões assim captadas eram de peque amplitude, Goldberger, em 1942, conseguiu ampliá-las, usando um artifício técnico: desligou o eletrodo do braço ou da perna que deveria ser conectado central terminal (Fig. 5-16B, 5-16Bc1, 5-16Bc2 [ 1 a 3]). Desde então, as derivações unipolares o membros passaram a ser chamadas de aVR, aVL e aVF (a = augmented).1
As três derivações unipolares dos membros têm linhas de derivações que vi dos ângulos do triângulo de Einthoven, passando pelo centro, até o meio do lado oposto. Por convenção, o vetor partindo do centro do triângulo mio projeção nessas derivações esteja entre o ângulo do triângulo e o seu centro será registrado como positivo e, entre o centro do triângulo e o lado oposto, negativo (Fig. 5-17A, 5-17B e 5-17C).
Assim, um vetor situado para cima e para a direita será positivo em aVR negativo em aVL e em aVF (Fig. 5-18).
Captação do Vetor P pelas Três Derivações Unipolares dos Membros
- Vetor P (Fig. 5-19A, 5-19B e 5-19C)
Para a frente - Para baixo
- Para a esquerda
Observamos que em aVL, pela nossa representação, a projeção de P será um ponto e o registro será uma linha isoelétrica. É fácil perceber que, mesmo sendo o vetor P para a esquerda, se ele estiver levemente para a direita, terá uma representação negativa em aVL; se estiver um pouco mais para a esquerda, representação em aVL será negativa.
Captação dos Quatro Vetores de Ativação Ventricular pelas Três Derivações Unipolares dos Membros
Em aVR (Fig. 5-20). Em aVL e aVF (Fig. 5-21A, 5-21B).
Captação do Vetor T pelas Três Derivações Unipolares dos Membros
Sistemas Triaxial e Hexaxial
Como vimos, o triângulo equilátero de Einthoven, com as convenções de polaridade, serviu de base para as projeções dos vetores no plano frontal. Temos então as seis derivações do plano frontal, sendo três bipolares (D1, D2 e D3) e três unipolares (aVR, aVL e aVF) (Fig. 5-23).
As linhas de derivação bipolar podem ser transportadas para que toda passem pelo centro do triângulo (deslocando-as paralelamente à sua situação primitiva), formando-se assim um sistema triaxial de Bayley (Fig. 5-24).
Superpondo-se a esse sistema, um outro, constituído pelas três linhas derivações unipolares dos membros, teremos um sistema hexaxial (Fig. 5-25)
Nesse sistema hexaxial podemos estudar qualquer vetor, partindo do centro, projetando-o nas seis linhas de derivações, considerando as já estabelecidas. Assim, o vetor Z, apenas por exemplo, será (Fig. 5-26):
negativo em D1 e aVL e
positivo em D2, D3, aVR e aVF.
Para localizar um vetor, usamos uma circunferência, passando pelos vértices do triângulo, graduada com as convenções conforme mostra a Fig. 5-27.
Observamos que o diâmetro horizontal separa dois campos: um, de valores positivos, situado inferiormente, e outro, de valores negativos, superiormente. Continuam as convenções já estabelecidas (p. ex., um vetor a 30º [em aVL], será positivo em aVL e em D1, negativo em aVF, um ponto em D2 etc. Um situado a 90º será um ponto em D1, negativo em aVF, em D2 e em D3, e por diante).
Podemos agora projetar o vetor P, os quatro vetores de ativação ventricular e o da repolarização ventricular nesse sistema hexaxial:
A - Projeção do vetor P (Figs. 5-28A, 5-28B, 5-28C e 5-28D)
B - Projeção dos quatro vetores de ativação ventricular (Fig. 5-29A, 5-29B, 5-29C, 5-29D, 5-29E e 5-29F)
C - Projeção do vetor T (Fig. 5-30)
Plano Horizontal
O plano horizontal é um plano paralelo ao solo que corta o tórax te abaixo do coração (Fig. 5-31).
Nesse plano, podemos projetar os vetores: P, os quatro da a ventricular e o da repolarização ventricular (T) (Figs. 5-32A, 5-32B e 5-32C).
Utilizando o artifício de Wilson, que obteve um potencial aproximadamente nulo no pólo negativo do galvanômetro (reunindo os três eletrodos das derivações clássicas na central terminal) e colocando o outro pólo, o positivo, ligado ao eletrodo explorador, sucessivamente em seis pontos clássicos da m precordial, teremos seis derivações precordiais assim especificadas (Fig. 5-33):
- V1 - no quarto espaço intercostal direito junto ao esterno;
- V2 - no quarto espaço intercostal esquerdo junto ao esterno;
- V4 - na intersecção da linha hemiclavicular esquerda corri o quinto espaço intercostal esquerdo;
- V3 - a meio caminho da linha que une V2 a V4;
- V5 - no mesmo nível de V4, na linha axilar anterior esquerda;
- V6 - no mesmo nível de V4 e V5, na linha axilar média esquerda.
Em condições especiais, usamos também outras derivações:
- V7 - no mesmo nível de V6, na linha axilar posterior:
- V8 - no dorso, imediatamente abaixo do ângulo da escápula esquerda.
Podemos usar, também, derivações no hemitórax direito, simétricas às clássicas do hemitórax esquerdo, que são chamadas de V3R, V4R, V5R e V6R.
As linhas de derivação desse plano são as retas formadas pela ligação de cada um dos pontos precordiais à projeção do centro elétrico do coração nesse plano (Fig. 5-34).
A projeção de um vetor que se situar entre esses pontos precordiais e a projeção do centro elétrico do coração será registrada como positiva, e a que se situar no prolongamento dessa reta, negativa.
Agora podemos entender as morfologias da onda P, do complexo QRS e da onda T, obtidas nessas seis derivações do plano horizontal.
Onda P (Fig. 5-35)
É sempre positiva de V3, a V6* Em V1 e V2 pode ser positiva, negativa ou difásico (ver Capítulo 13).
Complexo QRS (Figs. 5-36, 5-36A, 5-36B, 5-36C, 5-36D, 5-36E e 5-36F)
Observamos que as morfologias de QRS são predominantemente negativas, tipo rS, em derivações que defrontam o epicárdio ventricular direito, isto derivações precordiais direitas (V1 e V2); freqüentemente isodifásicas do RS nas derivações da zona intermediária septal. (V3 e V4); e predominantemente positivas e precedidas por uma pequena negatividade (q), podendo terminadas por pequena negatividade (s), adotando a morfologia qR ou e nas derivações que defrontam o epicárdio ventricular esquerdo, chamadas precordiais esquerdas (V5 e V6) (Fig. 5-37).
Nas precordiais direitas, cuja morfologia habitual é rS, a onda r é principalmente pelo primeiro vetor, e a onda S, principalmente pelo vetor. O segundo vetor está situado em torno da perpendicular da linha derivação de V , de modo que pode contribuir para a onda r, se a sua se situar no lado positivo, ou para a onda S, se no lado negativo. Se estiver exatamente perpendicular à linha de derivação de V1, sua projeção será ponto, não contribuindo nem para a onda r, nem para a onda S.
O quarto vetor habitualmente contribui para a negatividade (onda s) das precordiais esquerdas, cuja morfologia comum é qR ou qRs.
Em precordiais esquerdas, a onda q é gerada pelo primeiro vetor. A onda R, pelo segundo e pelo terceiro vetores. Se houver ondas s (morfologia qRs), esta foi gerada pelo quarto vetor, que no caso está para a direita. Se não houver onda s (morfologia qR), o quarto vetor pode estar para a esquerda, apenas contribuindo para a gênese da onda R (já vimos que o quarto vetor pode direcionar-se normalmente para a direita, para a esquerda ou perpendicular à linha da derivação V6). No caso de o quarto vetor estar perpendicular à linha da derivação V6, ele será representado apenas por um ponto, sendo então a morfologia de V6 do tipo qR.
Onda T (Fig. 5-38)
É sempre positiva de V3 a V6*. Em V1 e V2 pode ser positiva, negativa ou difásica. Em crianças e adultos jovens, é habitualmente negativa de V, a V2 e mesmo em V3, já que nesses indivíduos a onda T é freqüentemente para trás, para a esquerda e para baixo. As mulheres podem apresentar ondas T negativas até v3 ou V4*
Exemplos de Eletrocardiogramas Normais (Fig. 5-39A, 5-39B e 5-39C)
Bibliografia
1. Goldberger, E. Unipolar Lead Eletrocardiography. 2. ed., Philadelphia, Lea & Febiger. 1950.
2. Cooksey, J. D.; Dumm, M. &Massie, E. Clinical Vectorcardiography e Electrocardiography. Year Book Medical Publishers, Inc. 2. ed., 1977.
3. Toledo, A. N. Anotações de aulas.
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