Michael L. Epstein
Muitos tipos de distúrbios do ritmo cardíaco ocorrem em
crianças e recém-nascidos. A incidência depende da extensão da investigação
realizada. Na maioria dos casos, estas arritmias não têm significado clínico. Arritmias
sustentadas ou recorrentes podem requerer avaliação meticulosa e tratamento, causando
sintomas que exigem investigação completa e manuseio agressivo. A incidência de
arritmias em crianças e recém-nascidos com doença cardíaca é aumentada pelas
alterações que se seguem à cirurgia cardíaca. Entretanto, à medida que se adquire
maior conhecimento sobre o mecanismo destas arritmias pode-se ter progressos em minimizar
e possivelmente eliminar graves distúrbios de ritmo. Felizmente, o prognóstico a longo
prazo para a maioria destas crianças é excelente.
Distúrbios do ritmo cardíaco são caracterizados neste
capítulo como anormalidades na iniciação do impulso, anormalidades na condução do
impulso, ou uma combinação dos dois. Nenhuma tentativa é feita no sentido de apresentar
aqui uma discussão detalhada de todas as arritmias. Arritmias comuns são discutidas com
ênfase no diagnóstico e manuseio adequado pelo clínico.
Quando se avalia um paciente com suspeita de arritmia,
deve-se ter em mente que muitas variações no ritmo sinusal (impulso cardíaco inicial se
originando do nodo sinusal com condução subseqüente através do sistema de condução
normal) são consideradas normais. Estas variações afetam tanto a regularidade quanto a
freqüência. Atenção cuidadosa a este fenômeno pode eliminar a necessidade de
encaminhamento a um especialista.
A avaliação pelo clínico de um paciente com suspeita de
arritmia não precisa ser complexa. A obtenção de uma história minuciosa é importante,
visando particularmente a queixas de "palpitações" ou "taquicardia".
Quão rápida é a freqüência cardíaca? Em que circunstâncias os sintomas aparecem?
Quão ansiosa é a criança? E os pais? O exame físico pode evidenciar batimentos
prematuros ocasionais, mas geralmente é normal. Dependendo da queixa, um
eletrocardiograma, o qual deve ser um traçado padronizado de 12 derivações, pode ser
útil. Uma faixa de registro eletrocardiográfico não traz benefício adicional para um
paciente no qual o exame físico não tenha revelado uma alteração do ritmo.
Se a história for compatível com a possibilidade de
distúrbio de ritmo, ou os sintomas forem mais substanciais, uma avaliação adicional
pode ser indicada. Esta, provavelmente, será melhor concluída com o encaminhamento a um
especialista.
Procedimentos adicionais simples que podem ser realizados
para análise do ritmo são monitorização eletrocardiográfica ambulatorial (Holter) e
monitorização do evento. Monitorização ambulatorial é o registro eletrocardiográfico
contínuo em dois canais durante 24 horas. Esta técnica possibilita o registro durante o
sono e atividade normal. Um diário do paciente permite correlacionar os sintomas com as
alterações no ritmo. Os sintomas podem não ocorrer durante um intervalo particular de
24 horas; neste caso é útil um monitor de evento. Este monitor é um instrumento manual
que pode ser aplicado ao tórax assim que se perceba um sintoma, fornecendo um registro
eletrocardiográfico por 30 a 60 segundos. Vários eventos podem ser gravados, após o que
o instrumento é descarregado pelo telefone para a central de monitorização cardíaca,
onde é feito um registro em papel contínuo. Este processo apaga a gravação, permitindo
que o monitor de evento seja reutilizado.
Avaliação de dor torácica e síncope ou pré-síncope
é discutida no Cap. 9.
Anatomia do Sistema de Condução
Cardíaco
O impulso elétrico inicial normalmente se origina no nodo
sinusal, na coleção especializada de células anatomicamente distintas localizadas na
porção lateral alta do átrio direito justo abaixo de sua junção com a veia cava
superior (Fig. 11-1). A freqüência da
geração do impulso pelo nodo sinusal varia com o tônus autonômico, com catecolaminas
circulantes, e com uma variedades de medicamentos. O impulso ativa a musculatura atrial e
caminha através de vias extensas que não são anatomicamente distintas do resto do
tecido atrial (1). O impulso atinge os ventrículos através do nodo
atrioventricular, uma segunda coleção de células miocárdicas especializadas
localizadas no lado direito do corpo fibroso central entre o orifício do seio coronário
e o anel do folheto medial da válvula tricúspide. A extremidade ventricular do nodo
atrioventricular continua como um conglomerado compacto, conhecido como feixe de His, que
penetra no septo ventricular. O feixe de His se divide em ramo esquerdo e direito. O ramo
esquerdo se bifurca em fascículo anterior e posterior. Os dois feixes esquerdos e o
direito terminam no miocárdio como redes das fibras de Purkinje, resultando em ativação
do miocárdio ventricular. Conhecer estes principais componentes do sistema de condução
cardíaco é útil quando se pensa sobre os mecanismos de vários distúrbios no ritmo
cardíaco.
Desordens da Formação do Impulso
Variações no Ritmo Sinusal
O ritmo sinusal é definido como uma série contínua
de batimentos cardíacos caracterizados pela presença de uma onda P com eixo normal no
plano frontal, seguida, após intervalo apropriado (PR), por um complexo QRS. O eixo
normal da onda P sinusal é direcionado para a esquerda e para baixo. (Em indivíduos com situs
indiversus com imagem em espelho, o eixo de P é direcionado para direita e para
baixo.) A arritmia sinusal, um achado normal em crianças, é caracterizada por variação
repetitiva no intervalo P-P (e, logo, no R-R) com todas as outras características normais
do ritmo sinusal. A variação na freqüência coincide com a respiração e é modulada
por uma variedade de reflexos. A freqüência aumenta com a inspiração e diminui com a
expiração. Bradicardia sinusal é considerada por muitos como uma arritmia, embora seja
simplesmente o ritmo sinusal com freqüência abaixo do padrão aceito como normal.2,3
De forma semelhante, a traquicardia sinusal é o ritmo sinusal normal com uma freqüência
acima do padrão estabelecido para a idade do paciente. 2,3
Batimentos Prematuros
Contrações atriais prematuras (BAPs: batimentos atriais
prematuros, extra-sístoles atriais) são complexos que nascem no tecido atrial e ocorrem
precocemente em relação ao ritmo predominante. BAPs apresentam tipicamente uma onda P
cuja morfologia é diferente da onda P sinusal (Fig.
11-2). Se o batimento prematuro ocorre tardiamente após o impulso normal prévio, ou
nasce na parte baixa do átrio, relativamente próximo ao nodo atrioventricular, o
intervalo PR pode ser encurtado. Se a distância entre a última onda P sinusal e o
batimento prematuro for curta, o intervalo PR subseqüente poderá ser levemente
prolongado em relação ao normal. Quando o BAP é ainda mais precoce, ele pode não ser
conduzido aos ventrículos, porque o sistema de condução se encontra refratário. Neste
caso não há QRS, e uma pausa aparece no ritmo ventricular. A causa mais comum de pausa
no ritmo ventricular é um BAP não conduzido. Ocasionalmente, o impulso gerado pelo BAP
é transmitido através do sistema de condução atrioventricular (AV) especializado (nodo
AV, feixe de His e sistema Purkinje) quando apenas uma porção dos ramos permanece
refratária. Isto resulta em condução aberrante ao miocárdio ventricular, manifestada
como alteração na configuração, geralmente alargamento, do complexo QRS (Fig. 11-2).
Contrações juncionais prematuras (ESJs: extrasístoles
juncionais) comportam-se de forma parecida com as BAPs. O padrão eletrocardiográfico
típico da ESJ é um complexo QRS que ocorre prematuramente em relação ao ritmo
predominante, porém sem onda P precedente identificável. Uma ESJ pode ocorrer quando uma
porção dos ramos estiver refratária e desta forma produzir uma condução ventricular
aberrante como a descrita com BAPs. A pausa que segue uma BAP ou uma ESJ geralmente é
não-compensatória, significando que o intervalo entre o último complexo QRS normal e o
primeiro complexo QRS sinusal após o batimento prematuro é menor que o dobro do
intervalo R-R normal. Este fenômeno ocorre porque, na maioria dos casos, o impulso
prematuro penetra no nodo sinusal, recompondo-o. O próximo impulso sinusal ocorre no
intervalo normal após esta despolarização prematura do nodo sinusal, o que gera um
intervalo total que inclui um comprimento de ciclo atrial e o intervalo prematuro, cuja
soma é menor do que o dobro do intervalo R-R normal. Pode ser impossível distinguir,
pelo eletrocardiograma standard, entre uma ESJ e uma BAP que se origine numa parte
baixa do átrio e tenha sua onda P oculta no QRS.
Contrações ventriculares prematuras (BVPs: batimentos
ventriculares prematuros, extra-sístoles ventriculares) são impulsos que nascem de
sítios localizados dentro dos ventrículos, ocorrendo precocemente em relação ao ritmo
predominante. O padrão eletrocardiográfico típico é um complexo QRS anormal,
geralmente alargado, que tem pouca ou nenhuma semelhança com o complexo QRS normal (Fig. 11-3). Não há onda P associada ao
complexo QRS precoce. A onda T, representando a repolarização ventricular, que segue o
QRS anormal apresenta direção oposta à principal deflexão do QRS. Uma pausa
compensatória usualmente segue o BVP e, neste caso, o intervalo entre o último complexo
QRS normal precedendo o BVP e o primeiro complexo sinusal pós-BVP é aproximadamente o
dobro do intervalo inter-QRS normal. Este padrão ocorre porque o batimento prematuro que
nasce no ventrículo não é conduzido retrogradamente pelo sistema de condução
especializado até o átrio, logo, não recompõe o nodo sinusal. A freqüência atrial
não é alterada, produzindo uma pausa compensatória. É verdade, entretanto, que um BVP
pode ser conduzido de forma retrógrada para o átrio, reativando o nodo sinusal.
Portanto, a ausência de uma pausa compensatória não prova que um QRS precoce não seja
de origem ventricular.
A presença de uma contração prematura isolada atrial,
juncional ou ventricular é comum em crianças e recém-nascidos. A prevalência varia
entre 15 e 30 dependendo do método utilizado para detectar sua presença6-4.
Estas e outras arritmias são mais facilmente identificadas quando o paciente é
monitorizado com Holter de 24 horas do que quando é avaliado com eletrocardiograma
padrão que dura menos de 30 segundos. A presença de contrações prematuras isoladas
geralmente não tem significado clínico, mesmo quando ocorrem com padrão bigeminado
(isto é, após cada batimento normal) por períodos longos. Diferente das circunstâncias
em pacientes adultos, o número de batimentos prematuros durante um certo período (isto
é, BAPs ou BVPs por 24 horas) tem pouca importância e pode variar largamente de um
registro para outro. Logo, tratamento visando a diminuir o número de batimentos precoces
por dia não é justificado. As indicações de tratamento dependem da presença de
sintomas relacionados à etiologia da arritmia, se há doença cardíaca associada (isto
é, miocardite), ou se o paciente está recebendo medicação ou tem distúrbio
eletrolítico que possa predispor ao aparecimento de arritmias.
Contrações prematuras isoladas são especialmente comuns
em duas circunstâncias. Primeiro, recém-nascidos freqüentemente apresentam contrações
precoces, geralmente atriais, mas que não causam sintomas5,4. Tipicamente,
estes batimentos precoces desaparacem em torno de duas a três semanas de vida e não
requerem tratamento. Segundo, adolescentes saudáveis podem apresentar BVPs freqüentes.
Se monitorizados por período extenso, o número de BVPs por dia pode atingir milhares, e
longos padrões de bigeminismo ventricular podem ser registrados. Esta arritmia é quase
sempre benigna. Achados clínicos e eletrocardiográficos que corroboram um condição
clínica benigna incluem:6
1. Ausência de doença cardíaca subjacente
2. Morfologia uniforme do QRS
3. Supressão das BVPs pelo aumento da freqüência
induzida pelo exercício
4. Intervalo de acoplamento constante (intervalo entre o
início do último complexo QRS normal e o início da BVP)
5. Intervalo QT corrigido normal em repouso
A presença de duas ou três BVPs consecutivas era
considerada sinal ominoso no passado. Estudos mais recentes, entretanto, indicam que
bigeminismos e trigeminismos são benignos se as condições clínicas forem as mesmas que
as assinaladas acima para as BVPs isoladas.7,8
Taquicardia Supraventricular
Existe uma variedade de mecanismos que explicam uma
taquicardia supraventricular sustentada. O mais comum deles é a reentrada envolvendo uma
ou mais estruturas cardíacas. A reentrada descreve a excitação em torno de um
obstáculo fixo (Fig. 11-4). Durante a
condução normal, a excitação progride através de ambas as vias, cada uma delas tendo
velocidade de condução diferentes. Se ambas as vias provocam excitação do tecido
distal, o complexo resultante pode ser um batimento de fusão com uma porção do
miocárdio ativada através de cada via. O exemplo mais característico desta ativação
dupla é a pré-excitação ventricular típica da Síndrome de Wolff-Parkinson-White. A
taquicardia por reentrada ocorre quando a excitação é bloqueada em uma das vias mas
pode se conduzir pela outra. Se a condução intacta é lenta o suficiente, a excitação
pode progredir em torno da obstrução e passar retrogradamente através da via
previamente bloqueada. Assim, uma excitação sustentada de reentrada pode se iniciar.
Várias condições devem existir para ocorrer uma
taquiarritmia sustentada:
1. Duas ou mais vias anatômicas ou funcionalmente
distintas que são eletricamente contínuas.
2. Bloqueio unidirecional transitório ou contínuo em uma
das vias.
3. Condução suficientemente lenta na via de condução
que permita ao tecido previamente excitado restabelecer sua excitabilidade.
A taquiarritmia sustentada que mais freqüentemente requer
intervenção ou tratamento é comumente conhecida como taquicardia atrial paroxística
(TAP). O mecanismo usual desta arritmia é reentrada envolvendo uma ou mais estruturas
cardíacas. O tempo TAP entranto não é totalmente descritivo quanto ao mecanismo da
arritmia. De forma semelhante, o termo taquicardia supraventricular (TSV) não é preciso,
uma vez que em muitas circunstâncias os ventrículos participam do circuito de reentrada.
Apesar disto, TSV é largamente utilizado como um termo geral. O padrão
eletrocardiográfico típico é o de complexos QRS com duração normal ocorrendo a uma
freqüência rápida (geralmente 220 a 300 batimentos/minuto) (Fig. 11-5). Em várias ocasiões, ondas P
identificáveis estão presentes, aparecendo como deflexões negativas mais próximas do
complexo QRS precedente do que do subseqüente. Nesta forma comum de taquicardia, o ramo
anterógrado do circuito de reentrada é o sistema de condução atrioventricular
especializado normal – daí os complexos QRS normais. O ramo retrógrado do circuito
é uma via acessória com condução mais rápida do que a presente no ramo anterógrado
do circuito. Por esta razão é que as ondas P são mais estreitamente relacionadas ao
complexo QRS precedente.
Esta forma de TSV é a arritmia mais freqüentemente
associada à Síndrome de Wolff-Parkinson-White (WPW).9 A Síndrome WPW requer
um eletrocardiograma standard para o diagnóstico. Ela é causada pela presença de
uma faixa de miocárdio (feixe anômalo) conectado, pelo epicárdio, um dos átrios a um
dos ventrículos por cima do anel fibroso que geralmente separa o miocárdio atrial do
ventricular.10 O feixe anômalo usualmente é único, mas pode ser múltiplo e
ocorrer em qualquer local em torno do anel da válvula tricúspide, posterior ou lateral
em torno do anel da válvula mitral. As características eletrocardiográficas da
Síndrome de WPW são intervalo PR curto e onda delta (espessamento do ramo ascendente do
complexo QRS) que alarga o QRS (Fig. 11-6).
O tempo total no início de P ao final do QRS é aproximadamente normal. O QRS é um
batimento de fusão resultante da ativação simultânea dos ventrículos através do
sistema de condução atrioventricular especializado normal e do tecido miocárdico
acessório. À medida que aumenta a área de miocárdio ventricular ativada pela via
acessória, maior grau de pré-excitação ventricular (onda delta) é registrado no
eletrocardiograma.
O mecanismo da taquicardia em pacientes com Síndrome de
WPM geralmente é por ativação anterógrada do miocárdio ventricular através do
sistema de condução atrioventricular especializado normal, logo, produzindo complexos
QRS normais.11,12 A via acessória forma o ramo retrógrado do circuito de
reentrada; assim, na maioria dos casos de síndrome de WPW, a onda delta não está
presente durante a taquicardia. Bem menos freqüentemente o ramo anterógrado do circuito
da taquicardia é a via acessória, e o ramo retrógrado é ou o sistema de condução
atrioventricular especializado ou uma segunda via. Neste caso, todo o miocárdio
ventricular é ativado pela via acessória, gerando complexos QRS que se assemelham às
BVPs. Estes complexos têm sido denominados de completamente pré-excitados.
Esta arritmia, conhecida como taquicardia recíproca
antidrômica, pode simular taquicardia ventricular devida aos complexos QRS bizarros e
alargados.
Um indivíduo pode apresentar uma via acessória oculta,
produzindo eletrocardiograma com complexos QRS normais tanto em freqüência habitual
quanto durante taquicardia.13 Nesta circunstância, a via acessória ou conduz
apenas na direção retrógrada ou tem período refratário anterógrado tão prolongado
que em situações usuais a freqüência cardíaca é rápida o bastante para que a
condução atrioventricular, através da via acessória (manifestando-se como onda delta
no eletrocardiograma de superfície), não seja aparente. Em muitos casos de via oculta,
apenas estudo eletrofisiológico invasivo sofisticado pode comprovar sua existência e
determinar com segurança o mecanismo de uma taquicardia.
É possível uma pessoa manifestar Síndrome de WPW no
eletrocardiograma standard sem nunca experimentar taquicardia. Este paciente pode
não ser capaz de conduzir na direção retrógrada através da via acessória.
Entretanto, a ausência de taquicardia em indivíduos com síndrome de WPW é incomum. Os
episódios podem não ocorrer ou não serem reconhecidos durante a infância, mas
provavelmente se manifestarão em algum momento.
O tratamento agudo da taquicardia supraventricular
geralmente tenta aumentar o tônus vagal utilizando compressão, provocando reflexo de
vômito, ou aplicando água gelada subitamente na face.14 Massagem do globo
ocular nunca deve ser realizada devido ao risco de injúria do olho, incluindo
deslocamento de retina. Se as manobras vagais forem ineficazes, geralmente é necessário
o emprego de medicação intravenosa. Digoxina endovenosa demora algum tempo para
tornar-se efetiva, não sendo usada comumente como tratamento agudo da TSV. Verapamil
venoso tem mostrado sucesso,15,16 mas apresenta complicação potencial de
hipotensão secundária e colapso cardíaco, especialmente quando administrado a lactentes
abaixo de 3 meses de idade.17 Esta complicação é rara crianças acima desta
idade. Adenosina intravenosa tem, para muitos, suplantado a necessidade de considerar o
uso de verapamil. A dose inicial adequada é de 50 ?g/kg IV em bolus. Esta dose pode ser
aumentada a cada 1 a 2 minutos de 50 ?g/kg até o máximo de 200 ?g/kg. adenosina é
eficaz em interromper a taquicardia. Isto acontece pelo bloqueio de condução através do
nodo AV.18,19 A meia vida da adenosina é menor que 10 segundos. A adenosina,
entretanto, não deve ser usada em pacientes com asma. Crianças maiores devem ser
advertidas quanto à possibilidade de apresentarem breve dispnéia e sensação de calor.
Se a administração de adenosina for ineficaz ou não for possível devido à
deterioração das condições clínicas do paciente, deverá ser utilizada cardioversão
com corrente direta sincronizada (DC). Uma pequena carga de energia é geralmente
suficiente para o sucesso da cardioversão; por exemplo, um recém-nascido pode necessitar
de não mais que 1 a 2 joules (watt-segundos) por quilo de peso.
O manuseio medicamentoso subseqüente do paciente que
apresentou um episódio de TSV é direcionado a causar retardo na condução através de
um ramo do circuito de taquicardia. Mais freqüentemente é realizada uma tentativa de
retardar a condução pelo nodo atrioventricular usando digoxina, agentes bloqueadores
?-adrenérgicos (por exemplo, propranolol), ou agentes bloqueadores do canal de cálcio
(por exemplo, verapamil). Alguma vezes é necessário manuseio medicamentoso mais
agressivo, ou em substituição ou em associação com estas drogas. Neste caso uma
variedade de agentes antiarrítmicos podem ser incluídos, como quinidina, flecainida e
amiodarona.
Pacientes que apresentam episódios freqüentes de
taquicardia, especialmente aqueles resistentes ao tratamento com drogas, devem ser
considerados para estudo eletrofisiológico a fim de determinar o mecanismo exato da
taquicardia. Durante o estudo deve ser determinado se este paciente é um candidato à
ablação da via acessória por cateter de radiofreqüência ou à divisão cirúrgica da
via. Esses métodos interrompem o circuito da taquicardia, eliminando a arritmia.20,21
Taquicardia atrial ectópica é uma arritmia
supraventricular verdadeira, causada por aumento do automatismo de um foco localizado em
qualquer região dentro do átrio.22 Este foco pode ser despertado por
catecolaminas, drogas, ou outro estímulo resultando em ativação do átrio com
freqüências rápidas. O padrão eletrocardiográfico típico desta arritmia inclui onda
P de morfologia anormal e aumento gradual e progressivo da freqüência cardíaca até
atingir uma freqüência rápida fixa. Caracteristicamente, o término desta arritmia
também é gradual. A freqüência ventricular resultante desta taquicardia depende da
freqüência atrial efetiva e do grau de retardo através do nodo AV. O tratamento pode
ser dirigido a aumentar o retardo pelo nodo AV, com isso diminuindo a freqüência
ventricular, utilizando agentes como digoxina, propranolol ou verapamil. Medicamentos
direcionados ao foco ectópico incluem propranolol, quinidina, flecinida e amiodarona.
Entretanto, é comum que este tipo de foco ectópico seja resistente ao tratamento
medicamentoso. Neste caso, ablação por cateter de radiofreqüência ou remoção
cirúrgica do foco deve ser considerada. Felizmente, esta arritmia não é comum.
Flutter atrial é uma arritmia infreqüente em
pacientes que não tenham sido submetidos à cirurgia cardíaca prévia. O flutter
atrial é caracterizado no eletrocardiograma por um padrão típico de ativação atrial
em "dente a serra e algum de bloqueio atrioventricular" (Fig. 11-7). A freqüência atrial usualmente é
superior a 300 batimentos/minuto, e a resposta ventricular pode ser variável. O mecanismo
do flutter atrial parece ser uma forma de taquicardia de reentrada intra-atrial.
Uma cicatriz cirúrgica produz um foco em torno do qual pode haver reentrada atrial,
sugerindo uma razão para maior incidência de flutter atrial pós-operatório. O
tratamento do flutter atrial é semelhante ao descrito para a taquicardia atrial
ectópica, apesar do mecanismo diferente destas arritmias.
Flutter atrial pode ser encontrado em
recém-nascidos normais. Isto era considerado um achado ominoso,23 porém
estudos mais recentes sugerem que na ausência de doença cardíaca subjacente (por
exemplo, miocardite, cardiomiopatia) a presença de flutter atrial no
recém-nascido é geralmente benigna.24 Se a criança está estável, a
administração de digoxina usualmente resulta em conversão a ritmo sinusal, o qual é
mantido mesmo com a suspensão da droga. Uma criança que esteja hemodinamicamente
instável ou que não responda à medicação deve ser submetida à cardioversão DC, que
é quase sempre eficaz.