Capítulo 11 - O Eletrocardiograma Normal do Adulto Capítulo 11 - O Eletrocardiograma Normal do Adulto

José Hallake

Introdução

Para se analisar adequadamente um ECG, devemos adotar uma seqüência:

- Identificação do paciente
- Ritmo cardíaco
- Freqüência cardíaca
- Onda P
- Intervalo ou espaço PR (PRi)
- Segmento PR
- Complexo QRS
- Segmento ST
- Onda T
- Intervalo QT
- Onda U
- Deflexão intrinsecóide

Identificação do Paciente

Devem ser conhecidos, principalmente, a idade, o biótipo, a história clínica e os medicamentos eventualmente em uso.

Ritmo Cardíaco

O ritmo normal é o sinusal, isto é, o complexo QRS deve ser precedido de uma onda P positiva em D1 e D2.

Frequência Cardíaca

Deve oscilar entre 60 e 100 batimentos por minuto (bpm) no adulto; na criança, pode ser mais elevada, existindo tabelas mostrando a freqüência normal de acordo com a idade.

Para se calcular a freqüência cardíaca, se o ritmo for regular, podemos recorrer a réguas especiais que mostram como se proceder. Na falta delas, obtemos a freqüência cardíaca, se o ritmo for regular, dividindo a constante 1.500 pelo número de quadradinhos (mm) que se situam entre pontos homólogos de dois ciclos seguidos (entre dois ápices de R, por exemplo). Este número (1.500) foi obtido com base no fato de que o papel de registro desloca-se a uma velocidade de 25 mm/s e, portanto, 1.500 mm em 1 minuto.

Onda P

Habitualmente é uma pequena deflexão arredondada com as seguintes características:

a) Duração: oscila de 0,05 a 0,07 segundo em crianças e 0,07 a 0,10 segundo em adultos.

b) Amplitude: a amplitude máxima normal é de 2,5 mm (0,25 mV), considerando-se a maior amplitude. No entanto, é mais freqüente que a amplitude de P se situe entre 0,5 e 2 mm.

c) Morfologia: é habitualmente arredondada, monofásica, apresentando ocasionalmente pequenos entalhes, desde que entre um pico e outro não exista mais de 0,04 segundo. Em V1 pode ser difásica, correspondendo a fase inicial, positiva, à ativação da aurícula direita e a final, negativa, à da esquerda (Fig. 11-1).

d) Eixo elétrico de P (ÂP): no plano frontal o ÂP situa-se habitualmente entre +30º e +70º. A orientação média normal está em torno de +55º. Veja as Tabelas 7-1 e 7-2.

Intervalo ou Espaço PR (PRi)

Na prática, mede-se a duração do intervalo PR (PRi) desde o início da onda P até o início do complexo ventricular, quer ele comece por onda R ou Q.

A duração normal do PRi varia com a idade e com a freqüência cardíaca. De um modo geral, se o PRi for inferior a 0, 12 segundo no adulto (0,10 segundo na criança), deve-se pensar na síndrome de pré-excitação ventricular. Para os valores máximos normais de PRi, existem tabelas que nos auxiliam (Tabela 11-1). Quando registramos durações fixas superiores a esses limites, dizemos que há um bloqueio atrioventricular de 1º grau. Na prática, consideramos, para o adulto, o valor máximo normal de 0,20 segundo.

Segmento PR

É o espaço entre o término da onda P e o início do complexo QRS. Na prática, não é medido. Normalmente, esse segmento não deve apresentar desnivelamento superior a 0,5 mm. Pequenos supradesnivelamentos, sobretudo em presença de infarto agudo do miocárdio ventricular, pode sugerir corrente de lesão atrial (Fig. 11 -2).1

Complexo QRS

a) Duração: oscila de 0,06 a 0,10 segundo.

b) Amplitude: não existem critérios bem estabelecidos para alta voltagem. Há, no entanto, critérios para baixa voltagem: no plano frontal, quando em nenhuma derivação existe deflexão positiva ou negativa superior a 5 mm, ou quando a soma dos complexos ventriculares nas três derivações bipolares for inferior a 15 mm (Fig. 23-6). No plano horizontal, segundo Fattorusso e Ritter, diz-se que há baixa voltagem quando a soma das ondas R e S em V. for inferior a 9 mm, ou a 7 mm em V6.

c) Morfologia: no plano horizontal, os complexos ventriculares são predominantemente negativos nas precordiais direitas, isodifásicos na zona de transição e predominantemente positivos nas precordiais esquerdas (Fig. 8-1); já no plano frontal, as variações morfológicas; são inúmeras, em função das rotações sobre os eixos, já estudadas.

d) Eixo de QRS (ÂQRS): O ÂQRS em Indivíduos normais, no plano frontal, pode variar entre os extremos de 0º a +90º. A direção média do ÂQRS em adultos está em torno de +41,7º (Tabelas 7-1 e 7-2).2

Quando o eixo está entre 00 e - 90º, diz-se que há um desvio de ÂQRS para a esquerda e quando está entre + 90º e +180º, diz-se que o desvio é para direita. Esses são os critérios adotados por Marriott, os quais nos parecem bastante práticos, apesar de ficarem sem qualificação definida os ÂQRS localizados entre 180º e –90º. O Comitê de Critérios da New York Heart Association considera desvio do ÂQRS para a esquerda os compreendidos entre +30º e –90º e os para a direita, entre + 90º e -90º.

Segmento ST

É o intervalo entre o fim do complexo QRS e o início da onda T. Normalmente, o segmento ST é isoelétrico, não apresentando desnivelamento superior a 1 mm (0,0 1 mV) nas derivações periféricas e 0,02 mm nas precordiais. Contudo, em presença da vagotonia, podemos ter maior supradesnivelamento, com concavidade de ST para cima e seguido de onda T positiva (Fig. 11-3).

Onda T

a) Duração: normalmente, não é medida, sendo apenas incluída na medida do QT.

b) Amplitude: não há critérios bem definidos para a amplitude normal de onda T.

c) Morfologia: é arredondada e assimétrica, mesmo quando negativa em pre cordiais direitas.

d) Eixo elétrico de T (ÂT): o ÂT nos diferentes grupos etários, após a primeira década de vida, varia de +5º a +75º. Os valores de –10º a +83º são os limites extremos da normalidade, segundo Cabrera. Aceitamos, como o valor habitual médio de. ÂT, +45º (Tabela 7-2).

Intervalo QT

É o intervalo situado entre o início da onda Q e o término da onda T. Varia inversamente com a freqüência cardíaca e é menor no homem do que na mulher. É também menor em crianças até os 12 anos de idade.

O QT corrigido para a freqüência (QTc) pode ser rapidamente determinado utilizando-se a régua de Welsh. Há várias fórmulas para se calcular o QTc, porém a mais usada é a de Bazett:

Na prática, usamos uma tabela com o valor de QTc normal para cada freqüência, com um desvio padrão de 0,04 segundo (Tabela 11-2).

O QTc: aumenta na hipocalcemia, na hipopotassemia, sob a ação da quinidina,3 da procainamida4 etc., e diminui na impregnação digitálica, na hipercalcemia. e na hiperpotassemia.

Onda U

É uma deflexão pequena que se segue à onda T, com a mesma polaridade (Fig. 11-4). O vetor médio de U está situado para baixo, para a esquerda e para a frente, em torno de +60º no plano frontal, mas é difícil de ser determinado, porque a onda U é raramente identificada.

A gênese da onda U é muito discutida. Alguns autores acreditam que ela esteja ligada ao fenômeno de potenciais tardios da musculatura ventricular, mas a tendência atual, segundo Furbetta, é admitir que represente a repolarização dos músculos papilares.

Deflexão Intrinsecóide

É o tempo decorrido entre o início do complexo QRS e o ápice da onda R (Fig. 11-5). O limite máximo normal em V1 é de 0,035 segundo e em V6 é de 0,055 segundo. Como veremos nos Capítulos 14 a 18, esses valores aumentam nos casos de sobrecargas ventriculares, bloqueios de condução etc.

Exemplos de eletrocardiogramas normais podem ser encontrados nas Figs. 11-6, 11-7 e 11-8.

Bibliografia

1. James T. N. & Geoghegan, T. Sequential electrocardiographic changes following auricular injury. Am. Heart J., 46:830,1953.

2. Boccalandro, I.; Tranchesi, J.; Pileggi F.; Ebaid, M. & Macruz, R. Eletrocardiograma normal nos diversos grupos etários. In: Memorias dei IV Congresso Mundial.

3. Reynolds, E. W. & Vandler Ank, C. R. Quinidine syncope and the delayed repolarization syndromes. Mod. Concepts Cardiovasc. Dis., 45:117, 1976.

4. Strasbery, B. et al. Procainamide-induced polymorphous ventricular tachycardia. Am. J. Cardiol., 47:1.309,1981.

5. Tranchesi, J. Eletrocardiograma Normal e Patológico. 4. ed., 1972. Atheneu Editora São Paulo S. A.

6. Cooksey, J. D.; Dunn, M. & Massie, E. Clinical Vectorcardiography and Electrocardiography. 2 ed., 1977. Year Book Medical Publishers, INC.

7. Muniz, M. F. & Luna, R. L. Eletrocardiografta Clínica 1972. Editora Guanabara Koogan S. A. Rio de Janeiro.

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