Alcino Lázaro da Silva
Digestivas. Apendicite aguda; outras patologias apendiculares crônicas; lesões do
ceco e íleo terminal - volvo, ruptura, torção, intussuscepção, tiflite, tuberculose,
micose, câncer, tumores benignos; tumores do cólon ascendente; divertículo de Meckel e
sua patologia; espasmos de ceco; invaginação ileocecal ou obstrução; aderências
pericecais e periapendiculares (membrana de Jackson); ileíte regional (doença de Crohn);
ileíte terminal (doença de Boeck-Besnier-Schaumann-sarcóides múltiplos e benignos);
acotovelamento do íleo (membrana de Lane); adenites da fossa ilíaca - inespecífica,
específica, neoplásicas, hemopatias; visceroptoses - gástrica, vesicular; verminoses;
corpos estranhos (alimentos, cálculo, ossos); traumas de vísceras hematomas rupturas),
outras causas abdominais (colecistites, pancreatites, úlcera perfurada). Genitais Urinárias Osteomusculares Circulatórias Parietais. Observando-se mais atentamente essa enumeração de doenças pode-se agrupá-las,
praticamente, em doenças cirúrgicas urgentes, eletivas malignas e eletivas crônicas, e
em doenças clínicas urgentes e eletivas. História da dor. Início, qualidade, intensidade, extensão, ritmo, constância,
propagação, fatores que precipitam, agravam ou aliviam. Sintomas urinários; sintomas pleuropulmonares; cirurgias anteriores (formação de
aderências, obstruções parciais, apendicite em coto por apendicectomia etc.) e passado
ginecológico e obstétrico. Palpação. Suave, da região normal para o ponto doloroso; tranqüilizar o paciente;
impedir o choro da criança doente; distinguir uma distensão abdominal de uma contração
voluntária por estresse esforço ao vomitar, choro etc.; verificar a resistência da
parede abdominal e o ângulo costovertebral e quadrado lombar ou o hipogástrio, pois
podem estar acometidos por abscesso retrocecal; testar a sensibilidade da pele; distinguir
uma rigidez ou reação musculares. Blumberg. Desconforto pela retirada da mão após compressão do abdômen
(acometimento peritoneal). Rousing. Dor na fossa ilíaca por compressão manual sobre o cólon esquerdo
(acometimento peritoneal). Do psoas. Dor à extensão da coxa com o paciente deitado à esquerda (acometimento
retroperitoneal). Punção. Negativa, não vale para afastar diagnósticos. Ainda assim, se persistir a
indicação para a punção, colocar o paciente em decúbito lateral e puncionar, depois
de RX simples de abdômen, ao nível de borda lateral do reto abdominal na metade da
distância entre o umbigo e púbis. Raios X. Simples de abdômen - gás livre na cavidade (perfuração); nível
hidroaéreo; cálculo (ureteral, pancreático, biliar); apêndice gasoso (gangrena); íleo
local (infecções localizadas e tamponadas); desaparecimento da sombra de psoas
(abscessos). Enema opaco - repleção ou duplo contraste. Urografia excretora. REED.
Coluna lombossacra. Comentários
Introdução
A fossa ilíaca direita (FID) representa um ponto de atenção médica por
contribuir com rica e extensa patologia, tanto em condições de urgência como no
atendimento eletivo.
Além de sua patologia, é referência para a manifestação clínica de acometimentos
de estruturas adjacentes ou distantes.
As atenções dirigidas à fossa ilíaca direita decorrem desses fatos e do seu
comportamento clínico variado e às vezes simulador, aparentando tratar-se de um caso
cirúrgico quando na realidade é de tratamento clínico, ou vice-versa.
Resulta que o clínico e o cirurgião sempre têm situações de difícil decisão,
quando se pensa em abertura de cavidade para esclarecer uma dor na fossa ilíaca direita.
Esta decisão toma-se às vezes constrangedora quando se constata uma cavidade livre de
patologia cirúrgica.
Patologias
A patologia é variada e extensa. São acometimentos locais, vizinhos e a
distância, quando não gerais, que se manifestam principalmente através de dor na
região.
A lista, de doenças que produzem dor na FID podem ser divididas em: digestivas,
genitais, urinárias, osteomusculares, circulatórias, parietais e psíquicas. Além
destas, pode haver um número significante de patologias a distância.
Não basta o conhecimento de toda esta relação para que se faça o diagnóstico
positivo e etiológico e o conseqüente tratamento racional. É necessário o uso
pertinente e oportuno de uma propedêutica que possa completar um exame clínico
cuidadoso, paciente, vigilante e observador. Com estes recursos, pode-se chegar ao
diagnóstico definitivo e executar-se terapêutica racional com menor possibilidade de
erros, mesmo quando se inicia a terapêutica cirúrgica com urna laparotomia exploradora.
Os recursos clínico-propedêuticos existentes são múltiplos. Eles são usados de
acordo com a suspeita diagnóstica e a forma de manifestação clínica: urgente ou
eletiva. Nesta última, pode haver evolução crônica ou maligna
Fisiopatologia
Os acometimentos dos nervos somáticos ou viscerais manifestam-se sob forma de
dores características ou interatuam-se provocando dores do tipo referida ou reflexa,
Sendo o abdômen ricamente inervado, sobretudo pelos ramos do sistema nervoso autônomo e,
entre estes, os oriundos do plexo celíaco, explica-se por que a sintomatologia dolorosa
é exuberante e às vezes confusa. Corno os ramos do plexo celíaco inervam todo o delgado
e o cólon direito e a direção da raiz do mesentério se faz de cima para baixo e da
esquerda para a direita, situando-se em sua maior extensão no hemiabdômen direito,
entende-se por que este e em especial a fossa ilíaca direita apareçam como as regiões
mais freqüentemente acometidas pelas dores abdominais.
A dor na FID depende de doenças gerais, viscerais, peritoneais e de parede abdominal,
em decorrência de acometimento direto do peritônio e musculatura abdominal, ou de
maneira reflexa por inervação metamérica viscerossomática
As fibras aferentes sensoriais conduzem os impulsos dolorosos das vísceras abdominais,
via plexo ou glânglio, celíacos, penetram na raiz posterior do respectivo segmento
espinhal e atingem a modula. Aí, o estímulo se transfere para o segmento anterior, que
produz uma contração muscular, metamérica, involuntária. O músculo contraído pode
não se superpor exatamente sobre a lesão intracavitária, em conseqüência da mudança
de posição que as estruturas sofrem no processo embriológico de desenvolvimento do
feto. Assim, a distensão do intestino delgado estimula o SNA que, por sua vez, se
continua com o nono ao décimo primeiro nervos torácicos, indo afetar da região
umbilical ao quadrante inferior direito. O acometimento dos elementos do sistema
geniturinário através dos últimos nervos torácicos apresenta-se também clinicamente
com dor na FID. Na bexiga, que é inervada pelos ramos sacrais, a dor pode se manifestar
nos quadrantes inferiores em decorrência de acometimentos de sua cobertura peritoneal.
Havendo dor reflexa na FID, por doença em estruturas adjacentes ou a distância,
manifestações dolorosas referidas ajudam a orientar no diagnóstico diferencial: bexiga,
região suprapúbica; rim e ureter, no testículo; vias biliares, no ângulo inferior da
escápula porção central do diafragma, região supraclavicular etc.
A dor significa lesão orgânica, alterações funcionais (central ou metabólica) e
distúrbios de motilidade.
Para caracterizá-la, verifica-se, quase sempre, a seguinte correspondência: dor
localizada decorre de acometimento de um segmento de víscera; dor generalizada, presença
de líquido estranho ao peritônio parietal; cólica, por movimentos anormais de segmentos
que permitem fluxo de secreções (intestino, colédoco, ureter); dor reflexa dependendo,
através da medida, da inervação metamérica, igual para a víscera e parede abdominal e
a dor referida, quando o processo patológico atinge diretamente terminações de outros
nervos (o nervo frênico, por exemplo, produz dor na fossa supraclavicular, quando numa
gravidez tubária rota se encontra sangue na região infradiafragmática).
Propedêutica
A propedêutica de um paciente portador de dor na FID pode ser clínica,
instrumental, radiológica ou laboratorial.
No caso urgente o exame clínico e a observação vigiada são soberanos. No caso
eletivo cirúrgico tem importância o complemento da radiologia. No eletivo clínico, a
radiologia e o laboratório se agrupam para completar o exame clínico inicial.
Nem todos os recursos são usados na rotina porque a maioria das patologias com dor na
FID é cirúrgica. Entre estas, uma porcentagem significante fica por conta das patologias
apendiculares, cecais (tumores) e urinarias.
Há necessidade de atitudes mais rápidas e vigilantes, razão por que a seqüência
adiante constitui a rotina de exame de pacientes queixosos de dor na FID.
A enumeração não define prioridades. O seu uso, o cuidado e a insistência com cada
um dos tópicos, e a própria prioridade dependem de cada caso em particular:
Cope. Dor à rotação interna da coxa (acometimento do nervo obturatório).
Ott. Desconforto na FID quando o paciente se deita à esquerda (acometimento
peritoneal).
No diagnóstico da dor na FID, apesar dos métodos de computação e da riqueza
de exames complementares, o segredo maior é a habilidade que se deve adquirir em se obter
uma história completa e precisa. Esta atitude diminui acentuadamente o número de
laparotomias brancas.
Não há exames complementares específicos, e sim os de rotina (para afastar doenças
intercorrentes, fazer levantamento de estado geral) e alguns especiais, como a punção
exploradora por via parietal ou vaginal. No entanto, a indicação de cada exame
dependerá de um bom exame clínico, aliado a uma observação paciente e criteriosa,
sobretudo se o doente for criança, gestante, velho ou adulto obeso, cardíaco,
diabético, hemofílico, em uso de corticóide ou que tenha se submetido a uma vagotomia.
Estas condições alteram o ritmo, intensidade, extensão e gravidade das dores,
dificultando uma avaliação segura e oportuna.
Nos casos urgentes a condição fundamental é a precocidade da suspeita diagnóstica
para que a intervenção e recuperação sejam também precoces. Exceto em hemorragias por
rupturas de vasos maiores, o mais viável, racional, sensato e seguro é obter-se o
equilíbrio entre a cirurgia precoce e a observação vigiada, que dará ao médico a
noção exata de que realmente a dor persiste por mais de quatro a seis horas. Esta
condição é fundamental para decidir-se pela abertura da cavidade.
Perante uma dor abdominal aguda na FID, a expectativa principal varia com a idade, Na
criança, orientar para intussuscepção, apendicite ou diverticulite. No jovem, para
apendicite ou parametrites (na mulher). No velho, câncer e apendicite gangrenada.
Por ser mais freqüente, o acometimento do apêndice deve ser o centro do raciocínio
clínico e propedêutico perante uma dor na FID.
Vejamos o que o apêndice pode oferecer de dificuldades:
1. A sua posição em relação ao ceco é variadíssima.
2. O ceco é alto no adulto e criança, respectivamente, em 1 e 25% dos casos; é baixo
(pélvico no homem e na mulheres, respectivamente, 15 e 30% e pode ser ectópico (umbigo,
fundo-de-saco de Douglas e à esquerda).
3. Sessenta por cento dos pacientes apresentam história clínica atípica.
4. À histopatologia pode-se constatar 14 a 39,6% de apêndices normais em operações
onde havia suspeita de apendicite aguda.
5. Em pacientes internados com suspeita de processo agudo, 50% melhoram espontaneamente
e 14% do restante têm outra patologia (p. ex.: linfoadenite).
6. Em condições normais, a dor apendicular faz-se via 100 nervo
intercostal; em acometimentos mais avançados, a dor é mais intensa e depende do local do
apêndice: retrocecal, acima da crista ilíaca póstero- lateral ou supraumbilical nas
posições mais altas.
7. Na criança, há freqüentemente doenças extraperitoneais produzindo sintomas
abdominais: pneumonias, pielite, amigdalite, gastrenterite, hepatite, febre reumática.
No diagnóstico da apendicite precisamos excluir:
Grupo I (onde a apendicectomia é perigosa): pleurite, cardiopatia, febre tifóide,
porfiria, litíase renal, pielites.
Grupo II (onde a laparotomia pode ser necessária): ruptura de cisto, salpingites,
colecistite, peritonite primária
Grupo III (onde a laparotomia é obrigatória): úlcera perfurada, diverticulite
complicada, obstrução intestinal, perfuração do intestino, patologia ginecológica
aguda complicada.
No caso eletivo, ou seja, na dor prolongada, pode-se planejar propedêutica cuidadosa,
para que o diagnóstico seja positivo no pré-operatório. A atitude tem que ser intensiva
porque não se pode nunca esquecer que o câncer encontra-se no diagnóstico diferencial.
As causas da dor são múltiplas e dependem de acometimentos locais, vizinhos ou a
distância.
As doenças locais e vizinhas podem ser catalogadas em digestivas, urinárias,
genitais, parietais e osteomusculares, cada urna com sua característica e seu recurso
terapêutico.
Há um paciente, sobretudo o jovem (sexo feminino), que apresenta forte tendência à
conversão psicossomática, exteriorizada por dor na fossa ilíaca direita. Para este,
deve ser dada uma especial atenção para que não se catalogue uma patologia orgânica,
sobretudo se for neoplásica, como de fundo psicogênico.
Fundamentado no exposto, admitimos que frente a uma dor na FID, aguda ou crônica, o
diagnóstico deve ser rápido, preciso e etiológico. Em segundo plano, tenta-se o
diagnóstico sindrômico. Em terceiro lugar, afastar as causas locais, vizinhas e
psicogênicas de tratamento puramente clínico. Feito isto, persistindo dúvidas, não
esperar. Propor uma exploração abdominal, pois o atraso no tratamento de moléstias
cirúrgicas traz acentuado aumento da mortalidade.
As vias de acesso para tratamento de doenças da FID ou para exploração cirúrgica
são três. Se há diagnóstico de apendicite aguda, a incisão transversal, de tipo
Babcock-Davis é ótima para o acesso. Se a apendicite estiver complicada, ela pode ser
aumentada para a linha mediana cortando o músculo retoabdominal. Pode ser transformada,
também, em lombotomia ou em paramediana, pararretal interna infra ou supra-umbilical
(Elliot-Davis).
Nos casos duvidosos executa-se, inicialmente, a laparotomia paramediana, pararretal
interna, medioabdominal direita. Feitos a exploração e o diagnóstico, poderá ser
aumentada cranial ou caudalmente.
Em terceira alternativa fica a incisão transversal suprapúbica, de tipo Pfannestiel.
Só poderá ser usada em casos mais simples, onde temos a certeza de diagnóstico
sindrômico genital. Sua única vantagem é ser estética, mas tem inconvenientes, e para
uma cirurgia de urgência, não oferece bom acesso, é pouco segura para determinados
casos e não pode ser modificada com facilidade.
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